Com a mulher no mercado de trabalho, o homem deixou de ser o único provedor da casa, mas seu papel como pai ainda é indispensável
DAVID DEFOE

Uma das maiores alegrias que um homem pode sentir é a de segurar pela primeira vez seu filho recém-nascido no colo. Contemplar os olhinhos preciosos de seu bebê, pegar suas mãozinhas enrugadas com um só dedo ou escutar o doce som de seu chorinho… Essa é uma das experiências mais recompensadoras – e assustadoras – que se pode ter.
Junto com a euforia do momento, quase que instantaneamente surge um senso esmagador de responsabilidade. Em meio ao momento milagroso, os pais reconhecem que passam a ser responsáveis por uma vida que, naquele instante, nada pode fazer para se proteger, expressar seus sentimentos ou cuidar de suas necessidades básicas.
É impossível desconsiderar o impacto de um pai responsável na vida dos filhos. E não importam as condições dessa paternidade, se elas ocorrem num contexto familiar mais próximo ou distante dos ideais de Deus, o pai influencia muito no desenvolvimento espiritual, emocional e físico do filho.
OS TEMPOS MUDARAM
Por diversos fatores, a paternidade passou por mudanças colossais nos últimos 40 anos. Tendências culturais, fatores econômicos, acontecimentos históricos e movimentos em favor da igualdade entre os gêneros contribuíram para isso. Esse processo fez com que o pai deixasse de ser uma figura de autoridade preocupada com o sustento, o controle, a disciplina, o poder e a formação de valores, para assumir uma postura de apoio e de maior envolvimento emocional.
Em grande medida, essas transformações ocorreram por fatores econômicos. Desde a década de 1960, cada vez mais mulheres têm entrado no mercado de trabalho. De acordo com dados do departamento estatístico dos Estados Unidos, 64% das mães de crianças com menos de seis anos trabalhavam fora de casa em 2011. Em lares de renda dupla, a criação dos filhos costuma ser compartilhada e se espera dos homens maior participação nas atividades domésticas.
Essa alteração tirou o pai de seu papel primário de provedor e o envolveu nas atividades básicas de cuidado dos filhos. Por isso, não é incomum hoje ver homens nas reuniões da escola dos filhos, em casa com as crianças durante o dia ou realizando tarefas até então restritas às mães.
Procurando entender essas transformações, há anos pesquisadores estudam se existe relação entre as diferenças de gênero e a teoria do apego do psicólogo britânico John Bowlby, a qual sugere que bebês e filhos pequenos sejam condicionados a buscar proximidade com o cuidador que mais satisfaz sua necessidade de sobrevivência e segurança. Estudos mostram que o vínculo emocional mais próximo antes desenvolvido apenas com a mãe, agora também começa a ser construído com o pai.
Diante desses novos desafios, cada vez mais os homens têm buscado orientação de como exercer a paternidade numa cultura em transição. Livros e mais livros estão sendo escritos sobre esse novo contexto, e os homens consomem essas informações porque agora, mais do que nunca, criar filhos se tornou um esforço conjunto. Como então é possível ser um bom pai nesse processo de transformações?
SEJA PRESENTE
Os lares com pais e mães solteiros representam uma epidemia crescente na América do Norte e ao redor do mundo. Nos Estados Unidos, algumas pesquisas apontam que os filhos cujos pais se encontram por perto, vivendo em casa, tendem a apresentar menos problemas de conduta e abuso de álcool e drogas, bem como maior nível de autonomia e confiança.
No entanto, alguns efeitos negativos alarmantes se tornam aparentes quando os pais se ausentam da vida dos filhos. Segundo o National Center for Fathering (Centro Nacional da Paternidade), 20 milhões de filhos vivem atualmente nos Estados Unidos em lares sem a presença do pai. Entre as famílias brancas, esse número triplicou (18,3%) entre a década de 1960 e a de 2010. Mas, em relação ao mesmo período, os lares hispanos (26,3%) e dos negros (48,5%) apresentaram dados mais preocupantes.
Além disso, as pesquisas indicam correlações entre comportamento negativo e consequências psicossociais sobre essas crianças. O impacto do pai ausente parece ter desdobramentos na estabilidade econômica, no desempenho escolar, no abuso de álcool e drogas, na saúde física e emocional, na criminalidade e na sexualidade. Embora seja inconsistente atribuir tais estatísticas a um fator somente, é difícil negar a importância da presença do pai no desenvolvimento dos filhos.
ENVOLVA-SE
Há uma grande diferença entre estar em casa e estar “com” os filhos. Essa questão remonta a uma velha pergunta: é mais importante a quantidade ou a qualidade de tempo passada com as crianças? A resposta é: ambas. Na verdade, os pais precisam de engajamento. É preciso interagir intencionalmente com os filhos, não perdendo oportunidades de brincar, aprender e estabelecer uma conexão emocional com eles.
Engajar-se significa ser acessível e responsável. Acessibilidade tem que ver com o nível de comunicação com os filhos. Não diz respeito apenas à dedicação de tempo, mas à capacidade de ouvir sem julgar. Avalie se vocês costumam ter conversas significativas. Quando isso não ocorre, os filhos tendem a encontrar outras pessoas para conversar. Ellen White, pioneira adventista, aconselhou os pais a se aproximarem dos filhos na resolução dos problemas cotidianos. Dessa forma, as crianças enxergariam a orientação deles como algo sagrado (Signs of the Times, 6 de dezembro de 1877).
Por sua vez, responsabilidade no exercício da paternidade tem que ver com proporcionar aos filhos os recursos que eles precisam para ser bem-sucedidos na vida. Isso não significa apenas prover bens materiais, mas valores e habilidades emocionais que sirvam de ferramentas para a sobrevivência dos filhos no mundo. Já na segunda metade do século 19, Ellen White escreveu que a luta dos homens por dinheiro e status era o maior desafio para que priorizassem a formação dos filhos. “Se o pai deseja que seus filhos desenvolvam um caráter harmonioso, sejam uma honra para ele e uma bênção para o mundo, ele tem uma obra especial a fazer” (Signs of the Times, 20 de dezembro de 1877).
DESENVOLVA A CONFIANÇA
Uma das minhas especialidades clínicas é o aconselhamento em situações de luto. Muitas vezes, peço a meus pacientes que façam um gráfico com seu histórico de perdas. Você ficaria surpreso ao descobrir quantas pessoas citam a perda de confiança como a primeira decepção da vida. Isso ocorre, por exemplo, quando o cachorro de estimação da criança morre e é substituído por um parecido, na tentativa dos pais de esconder do filho o ocorrido. Ou quando há um divórcio e a mãe diz para a criança que o pai saiu de férias, sendo que ele nunca mais voltará.

Nossa tarefa é ajudar nossos filhos a desenvolver confiança e inspirar neles um senso de estima, resiliência e coragem para enfrentar um mundo que não costuma se impressionar nem com os melhores esforços. Isso só pode ser feito com incentivo, amor incondicional e apoio. Os filhos precisam aprender que são aceitos a despeito daquilo que fazem; e que são aplaudidos até mesmo quando caem, porque ousaram tentar.
Talvez o que possa inspirar os pais nessa longa caminhada seja aplicar o segundo princípio proposto por Stephen Covey no livro Os Sete Hábitos das Pessoas Altamente Eficazes: “comece com o fim em mente”. O destino que desejamos para nossos filhos é a salvação eterna e nosso objetivo de curto prazo é ajudar para que eles desenvolvam a capacidade de viver por conta própria. Por isso, ao longo do caminho precisamos manter o foco naquilo que eles mais necessitam em cada fase (ver quadro “Participe de cada etapa”). Nossa tarefa não é tomar decisões por eles, mas influenciá-los para que façam as melhores escolhas.
Os pais têm a tarefa importante de ser líderes e sacerdotes do lar. Eles precisam se fazer presentes na vida dos filhos e se engajar no desenvolvimento integral de suas crianças. À medida que o modelo de paternidade continua a mudar e o papel dos pais se expande, faria bem lembrar de uma citação de Ellen White: “O mundo não necessita tanto de grandes mentalidades como de homens bons, que serão uma bênção em seu lar” (O Lar Adventista, p. 38).
SAIBA +
PARTICIPE DE CADA ETAPA
O envolvimento do pai é importante em todas as fases de desenvolvimento do filho. Saiba quais são as necessidades básicas das crianças e como ajudá-las em seu desenvolvimento.
0 a 2 anos. A criança precisa de proteção física. Ela transita por um mundo com o qual só se conecta por meio de formas e cores que ainda não sabe definir nem apreciar.
3 a 6 anos. Os filhos se interessam pelo funcionamento das coisas, porque estão buscando encontrar sentido na realidade que os cerca. Nessa fase, o papel do pai é lidar com o bombardeio de “porquês” e estimular o espírito de descoberta do filho.
7 a 12 anos. Essa é a etapa em que eles passam por picos de crescimento. O pai precisa desenvolver uma comunicação aberta. Com o processo da puberdade, eles lutarão para construir a própria identidade. Por isso, é importante trabalhar com a autoafirmação dos filhos quando eles se depararem com dúvidas sobre a própria capacidade.
13 a 18 anos. É a fase da busca pela aceitação num grupo. Os adolescentes costumam valorizar mais a opinião dos colegas do que a dos pais. É nessa época também que os filhos buscam estabelecer seu sistema de crenças e descobrir sua vocação profissional. O pai deve incentivar o filho a tomar as próprias decisões.
19 a 30 anos. Na etapa da “decolagem”, os filhos desejam intimidade nos relacionamentos e propósito no seu engajamento na vida. É importante permitir que eles consolidem sua autonomia.
DAVID DEFOE é conselheiro clínico licenciado e pastor da Igreja Adventista New Life, em Gaithersburg, Maryland (EUA)
(Este artigo foi publicado originalmente na edição de agosto de 2017 da Revista Adventista)
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