As faces de Cristo

3 minutos de leitura
Professor norte-americano que estuda a imagem de Jesus nas artes visuais cristãs participa de evento realizado pela primeira vez no Unasp
Eclesiocom no Unasp - foto 2
Dr. David Morgan (à direita), traduzido pelo doutor Milton Torres, fala sobre como Jesus foi retratado ao longo da história e analisa o efeito das imagens religiosas no comportamento humano. Créditos: Márcio Tonetti

Um dos mais importantes eventos acadêmicos nacionais sobre mídia e religião foi realizado pela primeira vez no Unasp, campus Engenheiro Coelho (SP), na última quinta-feira, 18 de agosto. Promovida pela Cátedra Unesco de Comunicação, da Universidade Metodista de São Paulo, a Eclesiocom (Conferência Brasileira de Comunicação Eclesial) reuniu 340 participantes e contou com a apresentação de vários trabalhos científicos.

Para discutir a relação entre “Comunicação, Religião e Cultura Visual”, temática geral deste ano, o evento trouxe um dos maiores estudiosos do assunto, o doutor David Morgan, diretor e professor do Departamento de Estudos em Religião da Duke University, nos Estados Unidos.

Em uma de suas palestras, Morgan, que também é professor no Departamento de Arte, História e Estudos Visuais da universidade norte-americana, abordou como Jesus foi retratado nas artes visuais ao longo da história do cristianismo, especialmente no meio protestante.

Ao analisar representações de Cristo feitas em diferentes épocas, ele constatou que existem certas semelhanças nos desenhos. “Mas, afinal, como é possível olharmos para essas figuras e reconhecer que se trata de Jesus?”, o professor perguntou. Como ele observou, pessoas no mundo todo parecem reconhecer as imagens de Jesus que se popularizaram ao longo da história. Para Morgan, isso se deve à existência de arquétipos ou modelos mentais.

Retrato humanizado

O palestrante também mostrou que a partir do século 17 os artistas passaram a dar maior ênfase na personalidade de Cristo. “Na modernidade, compreender como Jesus é significava entender sua personalidade”, explicou. Isso deu margem para retratos de um Cristo mais “humanizado” e, consequentemente, à eliminação de símbolos associados ao catolicismo. Segundo Morgan, foi o pintor holandês Rembrandt van Rijn o principal responsável por imprimir caraterísticas terrenas à imagem de Jesus, retratando-o sem a tradicional auréola. “Ao retratar Cristo dessa forma, ele aproximou Jesus das pessoas. É como se elas olhassem para Cristo e Ele retribuísse o olhar”, argumenta o professor, que tem estudado não somente a cultura visual protestante, mas seu efeito no comportamento.

Tendências contemporâneas

Hoje, de acordo com David Morgan, há uma forte tendência de se conectar a figura de Jesus a diferentes etnias. Em decorrência do que chamou de “política de identidade” no meio religioso, o professor lembrou que não é raro ver a imagem de Cristo associada a grupos historicamente marginalizados, como negros, mulheres e tribos urbanas. Para Morgan, esse fenômeno está atrelado, em parte, a uma tentativa de transpor barreiras culturais.

Dra. Magali Cunha, organizadora da Eclesiocom, e o reitor do Unasp, Dr. Martin Kuhn, na abertura da 11ª edição do evento; Créditos: Márcio Tonetti
Dra. Magali Cunha, organizadora da Eclesiocom, e o Dr. Martin Kuhn, reitor do Unasp. Para ela, no cenário atual é impossível estudar a mídia sem a religião e a religião sem levar em conta sua relação com os meios de comunicação. Créditos: Márcio Tonetti

No painel realizado após as duas apresentações do palestrante internacional, a doutora Magali Cunha, organizadora da Eclesiocom, também comentou sobre seus estudos a respeito das imagens de Cristo no mundo gospel. Ela tem pesquisado especialmente a relação delas com a chamada teologia da prosperidade. “No meio evangélico pentecostal, por exemplo, algumas denominações retratam Jesus no trono, dando ênfase no Cristo vitorioso em vez de mostrar o Cristo sofredor. Assim, se percebe que as concepções teológicas exercem influência no modo como Cristo é representado nas imagens”, ressaltou.

Apresentação de trabalhos

Realizada pela terceira vez fora da Umesp, a 11ª edição da Eclesiocom também oportunizou a apresentação de 70 trabalhos. Publicados nos Anais do congresso, os artigos exploraram temas como a ficção nas produções midiáticas religiosas, uso de imagens na propagação da mensagem bíblica e a prática da religião no mundo virtual.

Alguns autores também analisaram questões relacionadas à comunicação adventista. O assessor de comunicação da igreja na América do Sul, Felipe Lemos, fez uma análise das notícias institucionais adventistas no Brasil e o desafio do relacionamento com os meios de comunicação externos. Editores da Casa Publicadora Brasileira também apresentaram pesquisas nos grupos de trabalho, abordando temáticas como o uso das novas tecnologias para o evangelismo on-line.

Contribuições do evento

Conforme acredita a professora Betina Pinto, organizadora local da conferência, a realização da Eclesiocom no Unasp motivou o surgimento de novos núcleos de pesquisa nessa área. Como preparação para o evento, o campus passou a oferecer a disciplina optativa de Mídia e Religião para alunos de Teologia, Jornalismo e Comunicação Social (Publicidade e Propaganda e Rádio e TV). Além disso, foi criado o grupo de pesquisa Excelsior!, coordenado pelo doutor Allan Novaes, que em sua tese de doutorado explorou a relação do adventismo com a mídia televisiva. Tanto os estudantes da disciplina quanto os integrantes do grupo desenvolveram pesquisas para ser apresentadas na conferência.

CAMILA TORRES é estudante de Jornalismo no Unasp, campus Engenheiro Coelho (com colaboração de Márcio Tonetti)

Última atualização em 16 de outubro de 2017 por Márcio Tonetti.