A bandeira da liberdade

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A causa que a Igreja Adventista herdou da Reforma é mais importante hoje do que nunca
Foto: Daniel Oliveira

Poucas palavras evocam sentimentos tão positivos como “liberdade”. De poetas a publicitários, de filósofos a políticos, de escravos a libertários, todos apelam para o conceito, embora nem sempre entendam ou vivam a verdadeira liberdade. Dependendo do momento histórico, esse tema ganha ainda mais relevância. Hoje se fala muito em liberdade, mas ela corre risco.

A Bíblia menciona frequentemente esse tópico. Por exemplo, ela diz que devemos escolher os caminhos da vida e não da morte (Dt 30:19); o Espírito do Senhor ungiu Jesus para proclamar a liberdade (Lc 4:18); a verdade e o Filho libertam (Jo 8:32, 36); onde está o Espírito está a liberdade (2Co 3:17); “tudo” é permitido, mas nem tudo convém (1Co 6:12); devemos viver como pessoas livres, mas não podemos abusar da liberdade e usá-la para o mal (Gl 5:13; 1Pe 2:16).

A ideia bíblica de liberdade, portanto, não é no sentido de uma licença para agir como quiser. Como ensina uma antiga ilustração, o trem é livre enquanto permanece no trilho. Se ele sair do trilho, ganha certa “liberdade” superficial, mas perde a verdadeira liberdade para ir, vir e cumprir seu propósito. O mesmo acontece com as pessoas que saem dos “trilhos”. Liberdade não é o direito de fazer o que é errado, mas ter a opção de fazer o que é certo.

Ainda vivendo o clima da celebração dos 500 anos da Reforma Protestante, vale lembrar o que Martinho Lutero escreveu sobre o tema em seu pequeno livro Da Liberdade do Cristão (1520): “O cristão é um senhor livre de todas as coisas e não está sujeito a ninguém. O cristão é servo de todas as coisas e está submisso a todos.” Esse paradoxo é expresso também pelo apóstolo Paulo: “Porque, sendo livre de todos, fiz-me escravo de todos” (1Co 9:19). Além disso, diante da assembleia de Worms em 1521, Lutero corajosamente disse: “Agir contra a consciência não é correto nem seguro.” Em seu tratado Sobre o Governo Civil (1523), ele escreveu: “A heresia é algo espiritual e não pode ser cortada com a espada, nem queimada com fogo, tampouco afogada com água.” E, por tudo o que ele defendeu nessa área, exerceu grande ­influência no pensamento da intelectualidade alemã. Há quem diga que a teologia luterana em sua essência tem que ver com sentir-se livre.

Se a liberdade é um dos dons mais preciosos na esfera pessoal, no ambiente coletivo e sociopolítico também é. O pensamento da Reforma sobre o assunto acabou levando à ideia da separação entre religião e política. No início, é bom que se diga, os reformadores não eram tão adeptos da liberdade assim. Tanto é que o fazendeiro Fritz Erbe morreu no Castelo de Wartburgo em 1548 pelas mãos de protestantes, que lhe negaram o direito de crer no batismo de adultos. Na verdade, importantes questões como a separação entre Igreja e Estado foram melhor defendidas e vivenciadas pelos reformadores radicais, como os anabatistas.

Foi por influência desse segmento da Reforma que a Igreja Adventista entendeu, desde seu início, que a bandeira da liberdade religiosa precisava ser agitada com vigor. A matéria de capa desta edição mostra como isso tem sido feito. Um dos primeiros defensores adventistas da causa, Alonzo T. Jones, escreveu no livro The Two Republics (1891): “Na promulgação dos princípios do protestantismo, e no trabalho da Reforma, os nomes de Martinho Lutero e Roger Williams não podem nunca ser corretamente separados. Williams completou o que Lutero começou; e juntos eles deram de novo ao mundo, e para sempre, os princípios originalmente anunciados por Aquele que era o Autor e Consumador da fé de ambos: Jesus Cristo, o Autor da liberdade religiosa.” Só para situar, Roger Williams (1603-1683) foi um influente teólogo batista inglês e defensor do direito de crença nos Estados Unidos.

Como pessoas livres em Cristo, precisamos levar a liberdade a todos, em todos os níveis. Deus nos liberta para ajudarmos o mundo a descobrir o que significa ser livre.

MARCOS DE BENEDICTO é editor da Revista Adventista

(Editorial publicado originalmente na edição de novembro de 2017)

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Última atualização em 16 de novembro de 2017 por Márcio Tonetti.