Entrevista

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A ciência da fé

Para o biólogo molecular Tim Standish, o brilhantismo do criador expresso na natureza salta aos olhos 

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A polêmica entre criacionismo e evolucionismo não é nova nos círculos cristãos. Porém, nos últimos tempos, ela se intensificou. Teólogos e cientistas se polarizam na tentativa de entender o que revelam os dados da natureza e da Bíblia. Para alguns, a criação progressiva e a evolução teísta seriam explicações válidas. Para outros, esses modelos entram em conflito direto com a visão bíblica. Afinal, Deus estaria sendo incoerente se ele tivesse criado a vida por meio da inimiga da vida.

Foi para discutir essas questões e firmar a crença na criação que a sede mundial da Igreja Adventista realizou recentemente uma conferência internacional e planeja organizar outras. Um dos mais ativos participantes nesse debate, sempre defendendo com admirável lógica o ponto de vista bíblico, é o Dr. Tim Standish, cientista do Instituto de Pesquisa em Geociências e professor na Universidade de Loma Linda, na Califórnia. Nesta entrevista, ele desafia os postulados do evolucionismo e afirma confiantemente a viabilidade do criacionismo.

Existe tensão entre ser adventista e cientista?

Não. Na verdade, ser adventista me traz um senso de liberdade como cientista, pois não sou forçado pela filosofia materialista a enquadrar os dados e as explicações em uma moldura conceitual predeterminada. Como biólogo molecular, tenho uma bênção “injusta”: para todo lado que olho, vejo a sabedoria e o brilhantismo do Criador. Alguns pensam que a ciência está em guerra com o cristianismo, mas quem o combate é um sistema filosófico diferente e alternativo, o darwinismo. A Bíblia nos encoraja a estudar a natureza.

A longo prazo, poderá haver uma polarização na igreja a respeito das origens?

Esse tema é polarizador. Se alguém rejeitar a criação bíblica, estará em tensão com a ampla maioria que a aceita. Esse é um dos desafios centrais que a igreja enfrentará. Mas estamos aqui para falar ao mundo sobre o Cristo que o criou. Isso é parte do evangelho eterno. A primeira mensagem angélica é um convite para adorar o Criador, o que não agrada ao diabo. Ele não se importa com quem ou o que as pessoas adorem, desde que não seja o Criador. O evolucionismo é uma espécie de religião secular, antagônica à verdadeira fé.

Qual campo de estudo tem apresentado evidências mais fortes em favor do criacionismo?

A bioquímica e a biologia molecular apresentam evidências extremamente difíceis de explicar pelo paradigma evolucionista. Em física também há muitas evidências de que o Universo tem um projetista. Já a geologia é uma ciência histórica e, por isso, não oferece o mesmo tipo de resposta definitiva. Ela depende muito do intérprete. É impossível voltar no tempo para ver se a interpretação dos dados está correta.

O senhor poderia mencionar alguma descoberta recente que favorece o modelo criacionista?

Uma área emergente na biologia molecular é a epigenética. Os traços epigenéticos se referem aos aspectos hereditários que existem em adição à base molecular. Para entender, vamos usar a analogia de uma receita herdada da mãe. Ao longo do tempo, a receita permanece a mesma. Contudo, a mãe poderia anotar a lápis na margem da receita para usar mais sal ou menos açúcar. Você pode experimentar a receita, apagar o que ela escreveu e fazer suas próprias observações. E então passa a receita aos filhos. A epigenética funciona assim. As anotações no DNA podem ser passadas adiante, apagadas ou reescritas. A epigenética mostra que os organismos podem se adaptar rapidamente a mudanças sem alterar a sequência do DNA. Isso evidencia que o projetista antecipou a necessidade de fazer ajustes.

Em seu campo de estudo, qual descoberta o impactou mais?

Em tempos recentes, foi a descoberta das funções do chamado “DNA lixo” na organização do genoma humano. Esse DNA é composto por genes que não codificam proteínas, mas têm um papel importante. Tal descoberta foi possível pelo estudo do consórcio Encode (sigla em inglês para Enciclopédia de Elementos do DNA). O termo “DNA lixo” é que teve que ir para o lixo. Outra descoberta incrível tem que ver com os genes. Há alguns anos, pensávamos em termos de um gene, uma enzima. Essa hipótese era tão boa que rendeu um Prêmio Nobel. Porém, estava errada. Agora sabemos que os genes individuais podem produzir múltiplas proteínas. Eles trabalham de maneira lógica em resposta a um desafio ambiental. Os genes são uma espécie de software inteligente. Isso é algo tremendo, de tirar o fôlego!

Para muitos cientistas, o projeto inteligente não é boa ciência, ou nem mesmo ciência. Por quê?

A questão não tem que ver com boa ou má ciência, e sim com a imposição de uma cosmovisão. Muitos cientistas são brilhantes, mas não entendem os pressupostos filosóficos da ciência. A visão naturalista acaba impondo suas explicações, e a visão supernaturalista é proibida. Para eles, o que não se enquadra em seu modo de pensar é considerado má ciência.

Desde Lucrécio, em 55 a.C., e Stephen Jay Gould, em 1980, paira no ar a acusação de que a imperfeição do mundo é um argumento contra o poder divino. Como explicar para um cientista a existência do mal no planeta?

A existência do mal não é um argumento contra o planejamento ou um designer, mas contra a bondade de Deus. Contudo, os cristãos têm evidência abundante da bondade divina exemplificada na vida, morte e ressurreição de Cristo. A cruz é a melhor resposta para o problema do mal.

E qual é a maior evidência de um projeto inteligente na natureza?

A presença das máquinas moleculares no interior das células é uma evidência muito convincente. Fazer uma máquina, com suas partes integradas, é algo complexo. Quando vemos máquinas operando em escala ­molecular sob os mesmos princípios físicos das máquinas que usamos no dia a dia, como os carros e os relógios, somos forçados a admitir que elas foram planejadas.

Quais sãos os pontos de contato entre criacionismo e projeto inteligente?

O projeto inteligente começa com a natureza e pergunta quais causas explicam o que observamos nela. O criacionismo parte de pressupostos bíblicos e busca sinais detectáveis da obra de Deus na natureza. Um argumenta da natureza para o design, o outro do design para Deus. Ambos veem dois tipos de evidências que exigem uma causa inteligente: ferramentas ou máquinas e informação.

É possível conciliar religião e ciência no ambiente secular da academia?

Se definirmos a ciência como um empreendimento totalmente materialista, como o ateísmo e o darwinismo, não. Mas há outra maneira de ver a questão. Em ciência, a autoridade são os dados empíricos; no cristianismo, a Bíblia é a autoridade final. Portanto, seria surpreendente se a ciência e a teologia cristã concordassem o tempo todo. Isso pode ser uma oportunidade para descobrir algo interessante.

O senhor fez uma apresentação sobre as diferenças entre os seres humanos e os chimpanzés. O que dizem os dados?

As estatísticas podem ser enganosas. Uma pequena porcentagem representa um valor numérico imenso. Se o genoma dos humanos e o dos chimpanzés fossem 99% idênticos, o que não são, eles seriam 1% diferentes. Para simplificar, isso representaria 30 milhões de diferenças entre esses genomas, sendo 15 milhões em cada linhagem após a separação de seu hipotético ancestral comum! (Naturalmente, não acreditamos em um ancestral comum.) Ao olharmos para essas diferenças, torna-se evidente que elas não seriam possíveis nem mesmo num período de 6 milhões de anos, conforme defende o darwinismo.

Então, os adventistas têm bons motivos para continuar crendo na criação da maneira tradicional…

A visão bíblica é a explicação mais coerente do que vemos ao redor e a compreensão teológica mais satisfatória da realidade. Entender que fomos criados por Deus nos dá uma perspectiva maravilhosa! Para o darwinismo, os seres humanos são animais sem nenhum status especial. E a mídia amplifica o impacto dessa ideia na sociedade, resultando na crescente perda do valor da vida humana. Já o criacionismo atribui o maior valor possível à vida.

SAIBA MAIS SOBRE O ENTREVISTADO
Trajetória

Alto, magro, bem-humorado, casado, uma filha, o Dr. Tim Standish nasceu em Sydney, na Austrália. Cresceu no Oriente (Malásia e Tailândia), onde os pais eram missionários. Fez o ensino médio em Cingapura e então foi para os Estados Unidos em busca de um curso superior. Estudou Zoologia na Universidade Andrews e, na mesma instituição, concluiu o mestrado em Biologia. Já o PhD em Biologia Ambiental e Política Pública foi conquistado na Universidade George Mason. Se alguns grandes nomes adventistas da ciência estão se aposentando, uma nova geração brilhante surge para assumir a vanguarda nessa área. Standish serve de ponte entre essas duas gerações. Seu estudo envolve as diferenças presentes no DNA de várias espécies. Para ele, é um prazer pesquisar a interface entre o projeto inteligente e o criacionismo bíblico.

Última atualização em 16 de outubro de 2017 por Márcio Tonetti.