O que Apocalipse 13 revela sobre os poderes antagonistas no tempo do fim
Jean Zukowski e Carlos Alves

Em 8 de maio de 2025, o cardeal Robert Francis Prevost foi eleito novo papa durante o conclave realizado na Capela Sistina, no Vaticano. Nascido em Chicago (EUA) e naturalizado peruano, Prevost adotou o nome Leão XIV. Ele é o primeiro papa norte-americano da história e foi escolhido após quatro votações por 115 cardeais.
Imediatamente após a divulgação da identidade e, principalmente, da nacionalidade do novo papa, as mídias sociais foram bombardeadas com diferentes hipóteses sobre o significado das profecias apocalípticas. Há grande especulação em torno de uma suposta aproximação emergente entre o Vaticano e os Estados Unidos, baseada no fato de o papa ser norte-americano. Diversas vozes, embora dispersas, alegam que este seria o momento em que a besta do mar e a besta da terra se unirão para perseguir o povo de Deus e, finalmente, desencadear os últimos eventos preditos na Bíblia.
Seria esse o caso? O que tal suposição revela sobre quão próximo o remanescente está de compreender a verdadeira mensagem do Apocalipse e qual é seu papel nos momentos cruciais que antecedem o desfecho do grande conflito?
Contexto geral de Apocalipse 12 a 16
As profecias do Apocalipse recapitulam a história do povo de Deus, revelando Sua atuação ao longo dos séculos, e apresentam detalhes sobre o confronto final entre o bem e o mal. Os capítulos 12 a 16 expõem o grande conflito de forma panorâmica, desde a expectativa pela primeira vinda do Messias até o resgate do remanescente do tempo do fim, em Sua segunda vinda, quando as forças das trevas serão aprisionadas, sentenciadas e, por fim, destruídas para sempre (Ap 15, 16).
Em meio a essa narrativa, o capítulo 13 concentra-se na identificação dos últimos instrumentos de Satanás, que serão usados para perseguir o remanescente fiel. O capítulo 14, por sua vez, apresenta a mensagem que o remanescente deve proclamar ao mundo, com o objetivo de adverti-lo contra os enganos de Satanás, o qual utilizará seus agentes com grande poder para atrair multidões e mantê-las presas em sua rebelião.
A incompreensão do cenário descrito em Apocalipse 13 conduz a uma visão distorcida do verdadeiro papel e da missão do remanescente. Por isso, é essencial interpretar essa porção das Escrituras de maneira criteriosa e responsável
A perseguição da besta do mar
O capítulo 13 de Apocalipse dá continuidade à narrativa do capítulo 12, segundo a qual o dragão (Satanás) persegue a mulher (o povo de Deus) até restar apenas um remanescente (Ap 12:17). Após utilizar as forças político-religiosas dominantes da Europa para perseguir aqueles que permaneceram fiéis aos mandamentos divinos, Satanás se coloca “em pé sobre a areia do mar” (v. 18), pronto para lançar mão de seus últimos recursos contra o remanescente. Ele emprega duas grandes estratégias: a perseguição e o engano. A maneira como utiliza as duas bestas de Apocalipse 13 revela a maestria com que executará seu plano final contra o povo de Deus.
A fim de compreender o papel de cada uma das bestas de Apocalipse 13 no cenário final, é necessário observar atentamente os tempos verbais utilizados no texto, os quais indicam o que esses poderes fizeram, o que fazem e o que ainda farão para enganar e perseguir o remanescente fiel.
A primeira besta surge do mar. Ela é descrita como possuindo “dez chifres e sete cabeças e, sobre os chifres, dez diademas e, sobre as cabeças, nomes de blasfêmia” (v. 1). João também observa que “era semelhante a leopardo, com pés como de urso e boca como de leão”, e que “o dragão deu à besta o seu poder, o seu trono e grande autoridade” (v. 2). Essa besta simboliza o poder religioso romano, que se consolidou no berço da civilização europeia e, conforme o texto bíblico, manifesta uma arrogância blasfema ao se colocar acima de Deus. Assim, ofende o “tabernáculo” e “os que habitam no céu” (v. 6), ao estabelecer um sistema de mediação humano que se opõe à obra sacerdotal de Cristo (Dn 8:9-14).
Esse poder político-religioso exerceu sua influência por “quarenta e dois meses” (v. 5), ou seja, 1.260 anos (538–1798). Em determinado momento, sofreu uma “ferida mortal”, a qual posteriormente “foi curada” (v. 3).
A incompreensão do cenário descrito em Apocalipse 13 conduz a uma visão distorcida do verdadeiro papel e da missão do remanescente
No presente, o dragão continua sua perseguição ao restante da descendência da mulher por meio da besta que surge da terra (12:17; 13:12-14), a qual exerce toda a autoridade da primeira besta diante dela (v. 12) e cria uma imagem da primeira besta (v. 14).
Quanto ao futuro, a profecia afirma que será essa besta da terra a responsável por homenagear a besta do mar e coagir os habitantes da Terra a adorarem-na (v. 8, 12-17).
Toda a autoridade que a besta do mar exerce é emprestada. Ela a recebe do dragão (v. 2), e o uso recorrente de verbos na voz passiva indica que sua capacidade de agir não é conquistada por mérito próprio, mas lhe é concedida por outrem. O texto bíblico afirma: “Foi-lhe dada uma boca que proferia arrogâncias e blasfêmias e foi-lhe dada autoridade para agir durante quarenta e dois meses” (v. 5); “Foi-lhe permitido, também, que lutasse contra os santos e os vencesse. Foi-lhe dada, ainda, autoridade sobre cada tribo, povo, língua e nação” (v. 7).
A besta do mar, ou seja, o poder papal, consegue atuar à medida que recebe autoridade e domínio político de terceiros. Isso ocorreu no passado (Dn 7:25); contudo, no futuro, a profecia indica que a autoridade de ação será da besta da terra. Dessa maneira, a besta do mar apenas receberá adoração de toda a Terra como resultado das ações da segunda besta (Ap 13:8, 12-17).
O papel da besta da terra
A segunda besta surge da terra. Em Apocalipse 12, a terra havia socorrido a mulher que estava sendo perseguida pelas águas. Essa besta é identificada como sendo os Estados Unidos da América, o primeiro país a instituir oficialmente a liberdade religiosa. Por sua vez, em Apocalipse 13, surge na terra um poder identificado como perseguidor, pois é dito que “tinha dois chifres, parecendo cordeiro, mas falava como dragão” (v. 11).
Se o poder romano surgiu na Europa e estendeu sua influência religiosa sobre territórios densamente povoados, o poder religioso americano nasceu no árido e desconhecido Novo Mundo. Um empreendimento histórico que, inicialmente, buscava a liberdade, acabou se transformando numa homenagem velada à autoridade romana. Os mandamentos de Deus foram substituídos por preceitos papais, e o mundo protestante, que um dia ergueu com firmeza a bandeira da Bíblia, curvou-se novamente diante dos emblemas das tradições humanas.
Assim, Satanás preparou a armadilha perfeita. Se a besta do mar era vista como um poder absolutista e ultrapassado, a besta da terra apresentava-se como portadora de um novo ideal, com aparência de cordeiro. No entanto, sua lealdade revelou-se voltada para Roma, não para Deus. É à autoridade da primeira besta que o Estado norte-americano e sua expressiva massa religiosa se submeterão, mais cedo ou mais tarde (v. 12).
Nesse contexto, o capítulo 13 de Apocalipse apresenta a besta da terra como o agente central da última perseguição. Embora a marca da besta do mar seja imposta a todo o mundo, e ela seja adorada em lugar de Deus, não é o próprio poder romano que arregimentará as nações em torno de si. O texto mostra que é o poder americano – especialmente em seu aspecto religioso protestante, aliado à sua expressiva influência política – que atuará com o objetivo de compelir todos a adorar a primeira besta (v. 12), promovendo a criação de uma imagem à besta (v. 14) e impondo a aceitação de sua marca de autoridade (v. 16, 17).
A Bíblia afirma que esse poder político, ao recorrer à sua dimensão religiosa, realizará “grandes sinais” (v. 13) e, por meio deles, enganará “aqueles que habitam sobre a terra por causa dos sinais que lhe foi permitido realizar diante da besta, dizendo aos que habitam sobre a terra que façam uma imagem à besta, àquela que foi ferida à espada e sobreviveu” (v. 14). Por fim, a besta da terra restaurará a perseguição medieval em toda a sua crueldade, levando o mundo a condenar à morte aqueles que se recusarem a adorar a besta do mar e a receber sua marca de autoridade (v. 15-17).
Em síntese, a besta da terra, que representa os Estados Unidos, exercerá a autoridade da besta do mar, símbolo da Igreja Romana, impondo sua agenda e conduzindo o mundo todo à submissão a esse poder. Dessa forma, o grande engano de Satanás será quase irresistível. Aqueles que outrora foram perseguidos – os protestantes que fundaram a nação norte-americana – se tornarão os principais apoiadores de seus antigos perseguidores, a Igreja Romana, que ainda reivindica ser a única representante legítima de Deus na Terra.
Os olhos do povo remanescente não deveriam estar voltados para a besta do mar, mas para a besta da terra
O mundo, espiritualmente cego, não percebe os atores já posicionados no cenário profético. A guarda do dia romano, como sinal de lealdade, une católicos e protestantes sob o vínculo de uma tradição comum. No tempo determinado, a grande perseguição se levantará contra aqueles que se recusarem a reconhecer a supremacia religiosa da besta do mar. Entretanto, é a besta da terra que tomará a dianteira: será ela quem promoverá, articulará e liderará a perseguição contra o remanescente fiel.
Visão panorâmica
Por isso, os olhos do povo remanescente não deveriam estar voltados para a besta do mar, mas para a besta da terra. É dela que virão os decretos que exaltarão e, por fim, imporão a obediência ao dia espúrio de guarda. Não será o papa quem assinará o decreto dominical, mas a cúpula norte-americana, influenciada principalmente por sua bancada evangélica, que reverencia o poder romano ao substituir os mandamentos de Deus por preceitos humanos.
É o protestantismo apostatado que conduzirá o mundo à adoração da Igreja Romana. É ele quem engana e seduz as massas por meio de sinais e maravilhas, sustentados por uma experiência religiosa de caráter místico, a fim de convencer as multidões de que o verdadeiro poder de Deus se manifesta justamente entre aqueles que transgridem os mandamentos revelados nas Escrituras.
No cenário do fim, onde estão os demais poderes globais? Onde está o Islã? A China? A Rússia? E as sociedades secretas, como a maçonaria e os chamados illuminatis? Eles não estão contemplados na profecia bíblica. O que o Apocalipse apresenta é a interação entre a besta do mar e a besta da terra, regidas pelo dragão, que atacarão o povo remanescente e tentarão levar o mundo a se afastar dos mandamentos de Deus. As demais nações e poderes do mundo se envolverão no conflito? Certamente. No entanto, será esse papel determinante para o cumprimento profético? Não. A profecia não aponta nessa direção.
E quanto à nacionalidade do papa: é relevante no panorama escatológico? Considerando que a besta da terra se interessa pela besta do mar por causa de seu falso mandamento – que se tornou parte intrínseca de sua própria tradição –, é difícil enxergar qualquer relação significativa entre a nacionalidade do papa e os grandes catalisadores da perseguição descritos em Apocalipse 13.
Os protestantes dos Estados Unidos, que possuem grande influência política, se voltariam a favor de Roma apenas porque o papa é norte-americano? A profecia não sustenta essa hipótese. O que o texto profético revela é que o protestantismo apostatado está enlaçado aos preceitos da Igreja Romana por meio de tradições espúrias que compartilham há muito tempo. Portanto, não há nenhum indício de nacionalismo como fator determinante no desenvolvimento histórico-profético. O foco da profecia não está na identidade ou origem do líder romano, mas na atuação da besta da terra e em seu papel de promover uma tradição protestante deformada, herdada do catolicismo, como norma global.
A missão do remanescente
A morte de Francisco suscitou uma série de discussões entre diferentes grupos adventistas. Alguns acreditavam que ele seria o último papa, baseando-se em uma interpretação peculiar e excêntrica das profecias, a qual ignora que, no livro do Apocalipse, as referências a bestas, cabeças e chifres dizem respeito a poderes e sistemas, não a indivíduos específicos.
A nacionalidade do novo papa, por sua vez, reacendeu outra vertente especulativa acerca da forma como se desenrolarão os eventos proféticos, ainda que essas interpretações careçam de respaldo bíblico e de uma abordagem coerente com os princípios da interpretação historicista.
Se Apocalipse 13 apresenta os agentes que Satanás utilizará para perseguir o remanescente, Apocalipse 14 revela as mensagens que esse pequeno povo deve proclamar ao mundo.
Essas mensagens confrontam diretamente o engano diabólico e seu poder de sedução mortal, que alcançará todos os lugares da Terra.
Enquanto se ocupa com assuntos periféricos e detalhes de pouca relevância, o remanescente corre o risco de não transmitir a mensagem com o som claro e inconfundível que o momento exige. Qual é, então, o papel do remanescente à medida que o conflito se aproxima de seu clímax?
Acima de tudo, ele deve compreender profundamente as três mensagens angélicas de Apocalipse 14 e proclamá-las com o desejo sincero de ver pessoas sendo salvas por Cristo e conduzidas à lealdade aos mandamentos de Deus. O remanescente deve estar atento aos verdadeiros sinais proféticos revelados nas Escrituras, os quais anunciam a perseguição iminente que atingirá comunidades em todo o mundo.
O sábado bíblico deve ser apresentado como o sinal da fidelidade a Deus, em contraste com o falso dia de guarda promovido pelas autoridades humanas. As Escrituras devem ser a norma definitiva, evidenciando que o movimento protestante norteamericano, ao se apegar às tradições humanas, se tornará o agente da intolerância e da perseguição contra os que optarem por permanecer fiéis a Deus, custe o que custar.
O remanescente deve se voltar para a Bíblia com seriedade e consagração. Diversos testemunhos foram deixados pelo Espírito de Profecia de maneira clara e direta, mas continuam sendo substituídos por teorias exóticas e tendências espiritualistas.
É necessário ler atentamente o Apocalipse, estudar com afinco o livro O Grande Conflito e comparar esses preciosos tesouros com materiais teológicos que apontam o protestantismo apostatado como o grande agente da perseguição final.
Acima de tudo, é preciso reconhecer o papel profético de representar a Deus neste mundo, vivendo em lealdade à Sua Palavra e guardando a esperança da gloriosa “manifestação de nosso Senhor Jesus Cristo” (1Tm 6:14).
Quando estivermos inteiramente focados em Deus e em Sua vontade, o Dono da Seara virá a fim de colher aqueles que amadureceram para a salvação, graças ao poder transformador do Espírito Santo.
JEAN ZUKOWSKI é diretor do Seminário de Teologia da Faculdade Adventista da Amazônia, em Benevides (PA), e CARLOS ALVES é pastor no Colégio Adventista de Macapá (AP)
(Artigo publicado na seção “Logos” da Revista Adventista de julho/2025)
Última atualização em 3 de julho de 2025 por Márcio Tonetti.