Território hostil

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Cristianismo avança de maneira surpreendente no Nepal apesar das leis que proíbem a evangelização
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Em cinco décadas, número de cristãos no Nepal passou de 100 para mais de 800 mil. Créditos da imagem: Fotolia

Com uma população de quase 28 milhões de habitantes, o Nepal é um dos países em que o cristianismo tem crescido de maneira mais rápida. Em 50 anos, o número de fiéis passou de 100 para mais de 800 mil, de acordo com dados dos censos demográficos realizados no período. Mas líderes cristãos nepaleses acreditam que o total de adeptos do cristianismo seja muito maior, chegando perto de 2,3 milhões.

No pequeno país asiático, de maioria hindu (90% da população), o cristianismo tem avançado apesar das restrições à liberdade religiosa. Sua nova Constituição, que entrou em vigor no ano passado, expressa que “nenhuma pessoa tem o direito de converter outra, fazendo-a mudar de religião, nem tomar medidas ou se comportar de forma a criar perturbações na religião dos outros”.

Desse modo, a legislação permite somente a prática das religiões tradicionalmente herdadas, a exemplo do hinduísmo, budismo e islamismo. “Os missionários estrangeiros são vigiados para se ter a certeza de que não estão propagando mensagens cristãs. Se alguém se queixar que você está convertendo pessoas, você terá problemas. Os hindus não convertem ninguém, tampouco os budistas, de maneira que essas duas religiões coexistem e são reconhecidas pelo governo e pela sociedade nepalesa. Porém, ambas consideram que o cristianismo é uma ameaça para elas”, conta o pastor Umesh Kumar Pokharel, líder da Igreja Adventista no país.

De acordo com Umesh, em meio à repressão estatal os cristãos são impedidos de distribuir literatura religiosa e até mesmo de portar Bíblias. Diante desse cenário, ele pede, inclusive, que as pessoas lembrem de orar pelos fiéis que vivem no país e sofrem com a intolerância religiosa.

Explicação para o crescimento

Apesar de o cristianismo não ser uma religião reconhecida pelo Estado nepalês, alguns fatores têm contribuído para o fortalecimento do cristianismo nessa parte do planeta. Contrário à discriminação, o ensinamento bíblico de que todos são iguais perante Deus é um dos aspectos da fé cristã que atrai milhares de pessoas das classes mais baixas, de onde vem a maioria dos novos conversos. Ao mesmo tempo, por representar uma ameaça para o sistema milenar de castas, isso desperta oposição.

Segundo ele, o evangelho também tem oferecido respostas e novas perspectivas para um povo frustrado com a realidade do país. Conforme explica Umesh, a corrupção, a falta de governabilidade e as dificuldades do governo em atender necessidades básicas levaram a população a perder a esperança nos líderes e partidos políticos. “As pessoas comuns estão sofrendo”, relata.

Como conta o líder adventista, diante disso, diversos grupos cristãos têm se esforçado para auxiliar as pessoas que enfrentam dificuldades, o que vem abrindo portas para o evangelho num dos países mais pobres do mundo.

Tendo em vista as leis anticonversão e as grandes necessidades sociais do Nepal, uma das formas mais comuns de pregar no país é por meio de programas de assistência social. “Em lugar de pregar diretamente, é mais conveniente aproximar-se das pessoas por meio de projetos sociais e programas que possibilitem mais qualidade de vida. Elas não gostam de uma apresentação direta de nenhuma religião. Por isso, os métodos mais eficazes implicam ações genuínas para atender suas necessidades físicas, emocionais e espirituais”, Umesh esclarece.

Atuação adventista

Encontro de várias igrejas adventistas do Nepal. Créditos: arquivo Josue Orellana
Encontro de várias igrejas adventistas do Nepal. Créditos: IASD Nepal

Com mais de 5 mil membros, 26 igrejas organizadas e 69 congregações, a Igreja Adventista na região tem procurado expandir sua mensagem principalmente por meio de uma instituição de saúde e da ADRA. Reconhecido pelas autoridades e pela população nepalesa, o Hospital Adventista Scheer Memorial está na ativa há mais de 60 anos. O médico Josue Orellana afirma que historicamente a instituição tem contado com a atuação de profissionais da saúde sul-americanos que se dispuseram a servir na região. Ele informa que atualmente há um médico argentino e um paraguaio trabalhando no hospital.

Orellana, que é boliviano, coordena outra importante frente de trabalho da Igreja Adventista no Nepal: a ADRA (Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais), presente no país desde 1987. “A ADRA Nepal é uma das maiores e mais respeitadas ONGs no país. Atualmente, ela desenvolve projetos visando melhorar a saúde e a educação das pessoas mais vulneráveis, além de capacitá-las para o mercado de trabalho”, informa o diretor da agência humanitária (clique aqui para ver o último relatório da ADRA Nepal, em inglês).

Com a ajuda de doações da ADRA em outros países, agência humanitária destinou mais de 5 milhões de dólares para vítimas dos terremotos em 2015. Foto: ADRA Nepal
Com a ajuda de doações vindas do exterior, agência humanitária destinou mais de 5 milhões de dólares para socorrer vítimas dos terremotos em 2015. Foto: ADRA Nepal

Outra frente de atuação é a resposta às emergências. No ano passado, a agência humanitária foi uma das organizações que prestaram socorro às vítimas dos três terremotos que deixaram um rastro de destruição e milhares de mortos e feridos. Segundo Josue Orellana, além de ter atuado no contexto imediato, distribuindo alimento, água, kits de higiene, lonas para os desabrigados e medicamentos, tanto a ADRA quanto o hospital adventista continuam envolvidos na reconstrução do país, apesar de o governo ter autorizado a assistência direta às vítimas por poucos meses após a catástrofe.

Atualmente, a agência humanitária está trabalhando na reabilitação do abastecimento de água potável, na construção de banheiros e tendas para abrigar alunos de escolas que foram destruídas, além de preparar a população para enfrentar desastres. “A ADRA e a igreja seguem ajudando as pessoas afetadas a restituir seus meios de vida. Também estamos empenhados na tarefa de reconstruir os templos que foram destruídos pelo terremoto”, acrescenta Orellana. [Márcio Tonetti, equipe RA]

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Última atualização em 16 de outubro de 2017 por Márcio Tonetti.