À procura de Deus

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Como tornar mais significativa sua caminhada com Ele
Crédito da imagem: Fotolia
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Há poucos dias, li um pequeno artigo de opinião publicado pelo site financeiro gobankingrates.com, sob o título “45 Ways to Make More Money in 2017” [45 maneiras de fazer mais dinheiro em 2017]. Segundo a autora, a jornalista e especialista em finanças pessoais, Cameron Huddleston, para aqueles que precisam aumentar “seu fluxo de caixa para pagar contas, poupar mais ou simplesmente melhorar seu estilo de vida, há muitas maneiras de ganhar mais dinheiro”.
Enquanto eu lia esse artigo, trechos de outro texto vieram à minha memória como lampejos. Trata-se do livro À Procura de Deus, de Aiden Wilson Tozer. Então fiquei pensando que, em contrapartida ao texto de Huddleston, como seria interessante um texto sob o título “45 Maneiras de Melhorar a Espiritualidade em 2017”. Finalmente, cheguei à conclusão de que não é necessária uma lista assim com tantos itens: a caminhada cristã é mais simples do que parece!

Disciplinas espirituais
O livro de Tozer aprofundou minha compreensão de que Deus está muito mais interessado em seu relacionamento com o ser humano do que nós imaginamos. Esse fato, por si só, deveria despertar o profundo desejo de valorizar a comunhão com Deus mais do que qualquer outra coisa neste mundo.
À medida que eu ia virando as páginas do livro, às vezes sentia algo semelhante ao que Alexander Tvardovsky, editor e escritor russo, sentiu em 1962, ao se deparar com o manuscrito de uma obra que mais tarde se tornaria um clássico da literatura mundial, Um Dia na Vida de Ivan Denisovich, do também escritor russo Alexander Soljenitsin, prêmio Nobel de literatura em 1970.

Tvardovisky sabia que não estava diante de um livro comum. Ele relatou que parou a leitura porque percebeu que não podia ler aquele manuscrito de qualquer maneira. Então se levantou, vestiu seu melhor terno escuro e uma camisa branca de colarinho engomado. Pôs uma gravata e calçou os melhores sapatos. E sentou-se novamente para ler um novo clássico.

Não assumi um comportamento tão radical quanto o de Tvardovsky, mas ao refletir sobre as declarações de Tozer, percebi que estava lendo a obra de alguém que teve um profundo contato com Deus, alguém que me ajudaria não a melhorar a aparência externa, mas a ornamentar o próprio templo da alma.

Foi assim, em estado de contemplação, que me deparei com a frase: “a Bíblia não é um fim em si mesma, mas um meio de trazer os homens a um conhecimento íntimo de Deus, pleno, de modo que possam ir a Ele, e alegrar-se em sua presença; e que possam provar e conhecer o deleite interior do próprio Deus no âmago e centro de seus corações.”

Eu ainda estava com esse pensamento em mente quando, minutos depois, encontrei outra pérola: “para que um homem tenha condições de buscar a Deus, primeiro Deus precisa ter buscado esse homem”. E outra: “Ter encontrado Deus e ainda buscá-lo é o paradoxo da alma”. E mais uma: “a superficialidade de nossa experiência interior, a falsidade de nossa adoração e a servil imitação do mundo, a qual demarca nossos métodos promocionais, tudo testifica de que […] conhecemos a Deus apenas imperfeitamente, e, raramente, sua paz”.

Em seguida, quase fiquei extasiado com essa linda oração (e eu estava apenas terminando o primeiro capítulo!): “Pai, quero conhecer-te, mas meu covarde coração teme desistir de seus brinquedos. Não consigo afastar-me deles sem sangrar em meu íntimo, nem tento esconder de ti o pavor que sinto desse afastamento. Achego-me tremendo, mas me achego. Por favor, remove do meu coração todas aquelas coisas que há tanto tempo acalento e que se tornaram parte do meu ser, de modo que tu possas entrar e habitar ali, sem um rival. Então, que tu tornes glorioso o lugar em que repousam teus pés. E meu coração não terá necessidade do sol, porque tu serás a luz, e não mais haverá trevas.”

Para Tozer, dois elementos estão na base de nosso relacionamento com Deus: oração e estudo da Bíblia. Porém, não se trata de uma oração superficial nem de um estudo descuidado da Palavra de Deus. Para ele, orar é abrir mão de nossos interesses para desfrutarmos da presença de Deus; estudar a Bíblia significa conhecer a vontade de Deus a fim de colocá-la em prática.

Guerra espiritual
O pensamento de Tozer está alinhado com as Escrituras. Em Efésios 6:10-20, Paulo resumiu a “armadura de Deus” em estudo da Bíblia e oração. Em linguagem figurada, Paulo nos apresenta os ingredientes básicos da vida cristã: verdade (v. 14), justiça (v. 14), evangelho (v. 15), fé (v. 16), salvação (v. 17). Uma leitura atenta demonstrará também que temos aqui uma espécie de síntese da jornada do cristão rumo à sua morada definitiva. Finalmente, Paulo conclui com os dois itens básicos: “a espada do Espírito, que é a Palavra de Deus; com toda oração e súplica, orando em todo tempo (v. 17 e 18, grifo acrescentado).

É claro que outras disciplinas também são úteis para fortalecer a espiritualidade. Richard Foster, em seu livro Celebração da Disciplina: O Caminho do Crescimento Espiritual, enumera dez delas. Além de estudo da Bíblia e oração, ele inclui meditação, jejum, simplicidade, solicitude, confissão, adoração, orientação e celebração. Por sua vez, Paulo também falou da alegria (Fp 4:4), da confiança (Fp 4:6), do cultivo de bons pensamentos (Fp 4:8), da gratidão (1Ts 5:18), da abstinência de toda aparência do mal (1Ts 5:18), da necessidade de ir à igreja (Hb 10:25), do testemunho pessoal (Ef 5:8,15), do sábio uso do tempo (Ef 5:16) e dos cânticos espirituais (Ef 5:19). A lista pode ser maior; porém, tudo pode ser resumido em estudo da Bíblia e oração, como descrito em Efésios 6:17,18. Afinal, que sentido faria, por exemplo, ir ao templo se não for para orar e estudar a Palavra em grupo? Sem oração e estudo da Bíblia as demais disciplinas espirituais perdem o significado.

Conhecedor da natureza humana, Paulo sabia que, por se tratar de algo óbvio, os crentes de Éfeso podiam não prestar muita atenção nessa exortação. Talvez, por essa razão, ele apresentou a armadura cristã sobre o pano de fundo do grande conflito: “Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para poderdes ficar firmes contra as ciladas do diabo; porque nossa luta não é contra o sangue e a carne, e sim contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas regiões celestes” (Ef 6:11-12, grifo acrescentado). Em Efésios 6:16, ele falou sobre “os dardos inflamados do maligno”.

Paulo estava tentando nos dizer que o inimigo contra quem lutamos não é um adversário comum, que se encontra em qualquer esquina. É alguém treinado em estratégias de guerra, perseverante, que está sempre pronto a atacar. Portanto, não podemos vencê-lo com o mesmo preparo que utilizamos para um passeio trivial. Estamos no meio de um conflito cósmico que se arrasta por milênios. É preciso perseverança e resistência e não podemos ceder espaço.

A advertência de Paulo não poderia ser mais clara: revistam-se de “toda a armadura de Deus” (v. 13, grifo acrescentado). Não serve a metade. É como se ele quisesse dizer: “Levem a sério a vida cristã”. Seu conselho é atual e digno de ser colocado em prática não somente neste novo ano, mas em todos os dias da nossa vida. A linguagem é bélica porque se trata da mais terrível das guerras: aquela que decidirá nosso destino eterno!

NILTON AGUIAR, mestre em Ciências da Religião, é professor de grego e Novo Testamento na Faculdade Adventista da Bahia e está cursando o doutorado em Novo Testamento na Universidade Andrews (EUA)

Última atualização em 16 de outubro de 2017 por Márcio Tonetti.