A contribuição de Floyd Greenleaf para a história do adventismo nas Américas e no mundo
Elder Hosokawa
Quem aprecia ler sobre a história do adventismo no Brasil e na América do Sul certamente já se deparou com obras de Floyd Greenleaf. Afinal, alguns de seus livros são bibliografia básica em qualquer curso que faça referência ao nosso desenvolvimento institucional. Mas você sabe como foi a trajetória de vida desse pesquisador que deixou um significativo legado historiográfico?
Floyd Lincoln Greenleaf nasceu no dia 23 de setembro de 1931 em Braintree, no estado de Vermont, região dos Estados Unidos que fica próxima da divisa com o Canadá. Seu avô materno, Andrew David Ladeau (1869-1960), casou-se em 1892 com Abbie Miriam Dompier Ladeau (1870-1940) e ambos trabalharam durante três anos no velho Sanatório de Battle Creek, Michigan, com o doutor John H. Kellogg. Os pais de Floyd eram adventistas e se casaram em 1924 na Igreja de Randolph, Vermont. Estabeleceram-se em Keene, onde sua mãe, Evelyn Gertrude Ladeau Greenleaf (1900-1985), foi professora da escola primária adventista e seu pai, Calvin Warren Greenleaf (1903-1997), trabalhou como colportor.
Na infância e na juventude, seus passatempos prediletos eram ler, colecionar selos, jogar beisebol e cantar no quarteto da escola junto com John Wendell Thurber, que mais tarde se tornou o segundo tenor do quarteto The King’s Heralds. Por ter sido criado num lar adventista de terceira geração, Floyd teve uma formação espiritual ativa e focada na missão. Ele concluiu o ensino médio na Forest Lake Academy, em Apopka, na Flórida (1949), graduou-se em História e Religião no Southern Missionary College (1955), em Collegedale, e se tornou mestre em História pelo Peabody College, em Nashville (1961). Depois, obteve o título de doutor na mesma área pela Universidade do Tennessee (1977), com a tese intitulada “Diplomacy of the Mexican Revolution: Mexican Policy and American Response, 1910-1913”, fruto de suas pesquisas nos arquivos do Ministério das Relações Exteriores do México.
Atuou como professor de História em instituições adventistas da Flórida, do Alabama e do Mississippi. Porém, sua maior contribuição foi para o Southern Missionary College (atual Southern Adventist University), onde serviu durante 31 anos como professor, presidente do departamento de História e vice-presidente acadêmico. Lá ele permaneceu até se aposentar, em 1997.
Seu interesse pela língua hispana e a cultura latina e centro americana veio de seus tempos de adolescência, quando os pais residiram por três anos na fronteira do Texas com o México. Aliás, Greenleaf frequentou a IASD de Weslaco, onde aprendeu espanhol e teve contato com a filha de Joseph W. Westphal, um dos pioneiros do adventismo na América do Sul. Foi daí que surgiu o interesse por estudar a história do México. E por acompanhar o progresso das Divisões Interamericana e Sul-Americana, que já estavam entre os territórios com o maior número de adventistas no mundo, Greenleaf decidiu pesquisar em fontes primárias denominacionais sobre o adventismo nessas regiões. Assim, em 1992, publicou pela Andrews University Press os dois volumes The Seventh-day Adventist Church in Latin America and the Caribbean.
Em 2005, o norte-americano escreveu In Passion for the World: a History of Seventh-day Adventist Education, traduzido para o espanhol. Nesse livro, ele narrou os primórdios da educação adventista na escola do lar de Buck’s Bridge, NY, com Martha Byngton, professora pioneira. Destacou o papel de Ellen G. White na fundamentação filosófica da rede educacional que começou a ganhar corpo em 3 de junho de 1872, com a criação da Escola Primária de Battle Creek, no Michigan, há exatos 150 anos. Mas também escreveu sobre escolas adventistas pioneiras do Brasil em Curitiba (PR), Gaspar Alto (SC) e Taquari (RS), e os primórdios do Seminário Adventista em Santo Amaro (atual UNASP, campus São Paulo).
Em 2007, o historiador recebeu do então reitor do Seminário Latino-Americano de Teologia (SALT), Alberto R. Timm, o convite para desenvolver algo mais amplo sobre a História da IASD no território da Divisão Sul-Americana. O desafio foi aceito. Greenleaf extraiu boa parte do material dos dois volumes acadêmicos que havia produzido 15 anos antes. Mesmo assim, levou três anos para preparar em inglês o livro Land of Hope: The Growth of the Seventh-day Adventist Church in South America, lançado em português e espanhol em 2011. Em português, a obra foi intitulada Terra de Esperança: O Crescimento da Igreja Adventista do Sétimo Dia na América do Sul. Trata-se de um livro monumental, com 832 páginas.
Aos 85 anos, o historiador publicou seu último livro, Nearly Forgotten: Seventh-day Adventists in Jamaica, Vermont, and Their Place in Vermont History. Floyd resgatou a trajetória dessa congregação rural que experienciou o millerismo e a transição para o adventismo ainda no século 19. E como experiente e aguçado historiador, estudou seu apogeu e declínio por meio de documentos escritos e orais, relatos pessoais, diários, registros da igreja que aparecem em publicações denominacionais e lápides.
Esse importante educador e historiador norte-americano encerrou sua missão como historiador lidando com uma questão que atinge o cerne de toda e qualquer produção historiográfica. Nenhum pesquisador fica sem alguma predileção, mas todos os historiadores devem ser, tanto quanto possível, imparciais. Floyd teceu uma narrativa empolgante com as peças essenciais do quebra-cabeça permanente da reconstrução do passado.
Greenleaf procurou desenvolver suas pesquisas elaborando uma narrativa histórico-denominacional que buscasse explorar a relação intrincada e dinâmica entre o percurso do adventismo e uma infinidade de agentes políticos, religiosos, sociais e econômicos em jogo nos séculos 19 e 20. Alguns de seus livros são obras referenciais e de abrangência global. Por meio de obras como Terra de Esperança (CPB, 2011), o pesquisador demonstrou a necessidade de dialogar com autores fora do contexto dos Estados Unidos e buscar o diálogo com a produção histórica local. Seus livros são relevantes para compreendermos, por exemplo, a contribuição cultural adventista nas Américas e no mundo. E as centenas de notas que cada um deles carrega é uma das marcas do seu apreço como historiador por documentar as fontes e permitir que outros pesquisadores seguissem seus passos na investigação do passado.
Vale destacar também que ele revisou obras como a de Richard Schwarz, publicada originalmente em 1975 e impressa em português com o título Portadores de Luz (Unaspress, 2009).
Além de ser um erudito, Greenleaf tinha habilidade em marcenaria. Sem contar que gostava de desenhar pessoas e paisagens. Inclusive, ele costumava produzir cartões de Natal para entregar aos familiares. Estudava a Lição Escola Sabatina em cinco idiomas: inglês, italiano, espanhol, francês e português. Viajou por 46 países e conheceu o Brasil em 1977. Uma década depois, também esteve presente no lançamento da pedra fundamental do prédio da União Central Brasileira (UCB), em Artur Nogueira.
Depois de se aposentarem, ele e a esposa deixaram o estado do Tennessee e se mudaram para a Flórida, onde foram membros ativos da Igreja Adventista de Port Charlotte, no período de 1998 a 2020. Floyd Greenleaf faleceu aos 90 anos (23/9/1931-1/4/2022), em Hendersonville, na Carolina do Norte (EUA). Deixa a esposa, Elizabeth, com que foi casado por quase sete décadas, dois filhos (uma filha faleceu em 2013), quatro netos e quatro bisnetos. Será lembrado por familiares e amigos como um homem de caráter, espiritual e gentil.
ELDER HOSOKAWA é historiador e atua como professor do Unasp, campus Engenheiro Coelho
Última atualização em 18 de agosto de 2022 por Márcio Tonetti.