Além da emergência

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A união de esforços para apoiar mais de mil famílias que foram vítimas das enchentes em Alagoas

Rebbeca Ricarte

Cinco toneladas de alimentos foram convertidas em cestas básicas. Foto: Divulgação ADRA

As cenas de inundações invadindo as ruas e chegando às casas das cidades alagoanas já se tornou algo comum nos noticiários do início do inverno. Nos meses de julho e agosto, quando o índice pluviométrico é mais concentrado em boa parte da região Nordeste, os cenários urbanos são os mais afetados. O elevado volume das chuvas e a baixa permeabilidade do solo geram dificuldades de escoamento da água, fazendo com que ela se acumule muito rapidamente nas casas. Neste ano, segundo dados da Defesa Civil, Alagoas chegou a contabilizar 24 mil pessoas desabrigadas e desalojadas por conta das chuvas, e 31 cidades decretaram estado de emergência.

Para apoiar as vítimas da catástrofe, a Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais (ADRA) promoveu uma campanha nacional de arrecadação via Pix. Além disso, foram realizados mutirões de doação em três pontos do estado. As comunidades mais afetadas receberam roupas, alimentos e materiais de limpeza e higiene. A campanha resultou em 5 toneladas de alimentos não perecíveis, 4 toneladas de frutas e verduras, cerca de 2 mil peças de roupas e 775 vales-compra. Vítimas das cidades de Maceió, Marechal Deodoro, União dos Palmares, Rio Largo, Matriz do Camaragibe, Jacuípe e Passo do Camaragibe foram atendidas com as doações.

UM POUCO PARA QUEM PERDEU TUDO

Maria Aparecida está desabrigada, perdeu tudo que tinha e sua casa de taipa corre o risco de desmoronar. Foto: Rebbeca Ricarte

No pequeno vilarejo de Auxiliadora, na cidade de Marechal Deodoro, Maria Aparecida, de 49 anos, desempregada, perdeu tudo. Morando em uma pequena casa de taipa de apenas dois cômodos, ela precisou sair às pressas quando a chuva se intensificou, deixando tudo para trás. “Quando voltei, depois de alguns dias sem chover e o nível da água ter baixado, estava tudo destruído. Como tem mais barro e palha do que madeira nas construções, a água levou tudo”, relata. Maria está morando em um abrigo provisório da prefeitura por tempo indeterminado. Com ela, outras pessoas do vilarejo também não podem voltar para suas casas pelo mesmo motivo: risco de desabamento. Maria recebeu da ADRA um vale-compra no valor de 160 reais para adquirir alimentos e materiais de limpeza e higiene.

As comunidades ribeirinhas também são muito afetadas pelas chuvas, pois rapidamente o nível da água sobe e toma conta das residências, principalmente as que estão próximas da margem. Esse é o caso do barqueiro Cícero da Silva, de 64 anos, que mora na comunidade do Riacho Velho há 13 anos. “Todo ano chove desse jeito aqui. Desta vez, a água subiu mais de um metro aqui em casa. Eu não consegui uma vaga no abrigo e tive que encontrar outra forma”, ele conta. Cícero transformou o barco em abrigo por uma semana, até o nível da água baixar e poder voltar para casa. Ao receber o vale da ADRA, o sentimento de Cícero foi de gratidão: “Essa ajuda veio em boa hora não só para mim, mas para todos que vivem perto do rio”, o barqueiro ressalta.

Patrícia Inácio, de 37 anos, mora com o marido e cinco filhos na mesma comunidade de Cícero. A família, que vive exclusivamente da pesca, perdeu quase tudo. E, por causa das chuvas, também foi prejudicada na atividade pesqueira. Mãe de um bebê de quatro meses, ela conta que o mais difícil quando a água começa a subir dentro de casa é não saber onde vai dormir com os filhos. “Fiquei muito emocionada porque essas pessoas vieram aqui nos ajudar. Ganhamos roupinhas para a bebê e esse dinheiro, que vai ajudar muito na compra de comida e fraldas, que é o que mais precisamos no momento”, ela ressalta.

KITS EMERGENCIAIS

Cícero da Silva ficou desabrigado e precisou transformar seu barco em abrigo por uma semana. Ele foi um dos que receberam o vale-compras. Foto: Rebbeca Ricarte

Os vales que ajudaram Patrícia, Cícero, Maria Aparecida e outras pessoas, totalizando 575 famílias atendidas, foram provenientes de uma doação direta do fundo emergencial da ADRA Internacional. Já a campanha nacional de arrecadação do Pix teve um foco específico: gerar vales para compra de kits de limpeza. Esses kits emergenciais, no valor de 110 reais, atenderam 200 famílias nas cidades de Jacuípe e Passo de Camaragibe. O foco dos kits emergenciais foi atender uma lacuna que não estava sendo suprida pelos órgãos municipais: a limpeza das residências pós-enchentes. “A gente identificou que a necessidade das famílias nesse momento de retorno para as casas era de material de limpeza e higiene. Com o voucher, elas podem adquirir esses itens nos mercados locais, gerando movimentação também na economia da região”, pontua Carla Fontes, coordenadora regional da ADRA Alagoas.

Após um alagamento, existem principalmente dois riscos envolvidos na volta para casa: ser contaminado durante a higienização da moradia e ser eletrocutado por fiações elétricas em curto-circuito. A água contaminada traz muitos riscos à saúde, entre eles, a leptospirose e a hepatite. E os materiais que estão na residência, sejam móveis, colchões ou alimentos, podem ser contaminados por essa água. Por isso, é necessário seguir as orientações do Guia da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e usar os produtos e as dosagens corretas para limpar os locais afetados.

DA EMERGÊNCIA AO ACOLHIMENTO

O Núcleo Regional da ADRA Alagoas segue monitorando as regiões mais prejudicadas e oferecendo apoio às vítimas, pois não se trata apenas de um apoio emergencial. As famílias auxiliadas foram previamente cadastradas, e isso servirá para o próximo passo: o acolhimento, que está sendo feito pelas igrejas locais. “A ADRA tem esse trabalho de atender durante a emergência e a Igreja Adventista vai continuar esses esforços, acolhendo, auxiliando, oferecendo apoio material e espiritual a essas famílias. Por isso, em todas as visitas, cadastros e entregas, os pastores e líderes das congregações locais estiveram junto conosco, conhecendo essas pessoas e começando a estreitar os laços”, Carla destaca.

Além disso, a ADRA Alagoas, em sua sede regional, tem desenvolvido projetos que continuam a obra de assistência a quem está em situação de vulnerabilidade social. Em média, o projeto “Mãos que Alimentam” entrega cestas verdes semanalmente para cerca de 50 famílias. Essas cestas são compostas por frutas, legumes e verduras, e são arrecadadas por voluntários da agência humanitária durante a madrugada, com o apoio de feirantes da capital alagoana.

Para o público infantil, a ADRA Alagoas desenvolve um projeto de prática esportiva. Além disso, semanalmente, 55 crianças participam do Clube da Leitura no espaço da ADRA, utilizando como material de apoio a revista Nosso Amiguinho. Cada um deles recebeu a assinatura do periódico pelo período de um ano. Por sua vez, o projeto “Saúde Total” oferece atendimento gratuito em diversas especialidades médicas e tratamento odontológico. Já o “Mente de Esperança” é uma roda de conversa e grupo terapêutico. “Todos os nossos projetos de desenvolvimento social e comunitário têm como objetivo trabalhar com essas famílias para que elas consigam mecanismos para sair dessa situação de vulnerabilidade social”, Carla ressalta.

Para o líder geral da Igreja Adventista no Estado de Alagoas, Flávio Henrique de Oliveira, mais do que nunca, o braço social é um importante instrumento para a igreja. “Agora é o momento de vivermos o evangelho na prática! A igreja precisa unir forças com a ADRA para conseguir amenizar a dor dessas pessoas. Quando ajudamos os outros, ajudamos a nós mesmos”, ele conclui.

REBBECA RICARTE é jornalista

(Reportagem publicada na Revista Adventista de setembro/2023)

Última atualização em 31 de agosto de 2023 por Márcio Tonetti.