Orientações de Ellen White para o namoro e o casamento
Chantal Klingbeil
Os relacionamentos amorosos, profissionais e até nosso vínculo com Deus podem ser complexos. Em momentos assim, frequentemente necessitamos de ouvido atento. Ellen White escreveu diversas cartas, oferecendo conselhos práticos. As pessoas passaram a valorizar rapidamente suas instruções nessa área, e escreviam-lhe fazendo perguntas que variavam do profundo ao trivial.
No entanto, Ellen White não forneceu todas as respostas. “Além disso, ela desejava desacostumar os cristãos de escorar-se nela para tomar decisões pessoais rápidas e livres de erro. Estimulava as pessoas de sua época a tornar-se seguras em sua relação com Deus à medida que Ele lhes falava individualmente” (Herbert Douglass, Mensageira do Senhor [CPB, 2001], p. 419, 420).
Ela apresentou estudos de caso nos quais incentivou os leitores a, em espírito de oração, descobrir e aplicar os princípios que envolviam os relacionamentos. Esses princípios continuam relevantes para os nossos relacionamentos no século 21. Antes de analisarmos um desses princípios, vamos explorar o contexto do namoro e do casamento na época em que Ellen White viveu.
ROMANCE NO INÍCIO DO SÉCULO 19
A ideia de “seguir seu coração”, “encontrar uma alma gêmea”, ou até mesmo se apaixonar, era um conceito estranho no início do século 19. O namoro deveria ser um assunto relativamente desprovido de emoção, sendo que fatores como status social e finanças eram considerados muito mais importantes para um casamento adequado do que o estar apaixonado.
No entanto, nos primeiros anos do século 20, essa concepção começou a mudar rapidamente. As enormes mudanças sociais e econômicas ocorridas nos Estados Unidos tiveram impacto profundo na sociedade, inclusive no namoro e no casamento. O foco do namoro passou a ser a paixão, em vez de encontrar um bom partido. Embora os pais ainda fossem consultados, rapazes e moças começaram a ser mais independentes ao escolher um parceiro para o casamento.
Mesmo assim, o propósito principal de todo namoro era o casamento. Isso contrasta fortemente com os dias de hoje, haja vista que namorados podem passar anos sem abordar o tema do casamento, e noivos podem não ver a necessidade de fixar uma data para a cerimônia.
À medida que os livros se tornaram mais acessíveis, os romances se popularizaram consideravelmente. E o amor romântico, em vez da compatibilidade, passou a ser o objetivo do namoro. Ellen White aconselhou contra a leitura desse tipo de literatura, pois ela promovia o “sentimentalismo apaixonado” e dificultava a identificação e o desenvolvimento do amor verdadeiro. A maioria desses romances focava em diversos cenários de cortejo e culminava com o casamento, no qual dois personagens que se apaixonaram, miraculosamente transformados pelos votos matrimoniais, agora se tornavam “felizes para sempre”. Ellen White tinha uma visão mais realista do casamento.
“Ninguém consegue, com tanta eficácia quanto o marido, estragar a felicidade e a utilidade de uma mulher e tornar-lhe a vida um fardo pesado. E ninguém consegue fazer o mínimo que seja para despedaçar as esperanças e aspirações de um homem, para lhe paralisar as energias e arruinar-lhe a influência e as perspectivas, como sua própria esposa. É a partir do momento em que se casam que muitos homens e mulheres datam seu êxito ou fracasso nesta vida e suas esperanças de existência futura” (Review and Herald, 2 de fevereiro de 1886).
SE NOTARMOS QUE ESTAMOS PERDENDO O INTERESSE NAS QUESTÕES ESPIRITUAIS, É PROVÁVEL QUE UMA PAIXÃO DESEQUILIBRADA, E NÃO O AMOR GENUÍNO, ESTEJA IMPULSIONANDO O RELACIONAMENTO
Foi dentro desse contexto cultural de namoro que Ellen White apresentou diversos princípios bíblicos para auxiliar na escolha de um parceiro para o casamento. A relevância desse assunto é evidente no notável número de cartas que ela escreveu para pessoas em busca de orientação. O livro O Lar Adventista reserva uma seção completa ao tema do namoro e casamento. Como exemplo, iremos considerar apenas um desses princípios.
À PROCURA DO AMOR
Embora a cultura possa associar o amor a uma explosão inesperada de atração apaixonada, um cristão compreenderá que uma paixão intensa nem sempre é amor verdadeiro. Em vez de aguardar sentir-se atraído pelo amor, um cristão analisará cuidadosamente os potenciais parceiros. Ellen White definiu o amor como um princípio, não apenas como um sentimento.
“O amor é um dom precioso que recebemos de Jesus. A afeição pura e santa não é sentimento, mas princípio. Os que são movidos pelo verdadeiro amor não são irracionais ou cegos” (Ellen G. White, A Ciência do Bom Viver [CPB, 2021], p. 222).
Observe que a declaração acima não implica que o amor seja destituído de sentimentos, mas que o amor verdadeiro possui uma compreensão sólida da realidade e conhece profundamente a pessoa que escolhe amar. Aqui está outra afirmação que auxilia na definição do amor:
“O amor […] não é insensato; não é cego. É puro e santo. Mas a paixão do coração natural é algo totalmente diferente. Ao passo que o amor puro introduzirá a Deus em todos os seus planos e estará em perfeita harmonia com o Espírito de Deus, a paixão será obstinada, precipitada, insensata, desafiadora de toda restrição, e tornará o objeto de sua escolha um ídolo. Em toda conduta de uma pessoa possuída de amor verdadeiro se manifestará o amor de Deus. Modéstia, simplicidade, sinceridade, moralidade e religião caracterizam todo passo no sentido do casamento. Os que são assim regidos não se absorvem na companhia um do outro com detrimento do interesse nas reuniões de oração e de culto” (Ellen G. White, O Lar Adventista [CPB, 2021], p. 38, 39).
Na citação anterior, Ellen White faz uma declaração intrigante. Ela enfatiza que, ao transformarmos a outra pessoa em um ídolo, estamos nos colocando em perigo. Um ídolo é qualquer coisa, ou até mesmo qualquer pessoa, que venha a ocupar o lugar de Deus em nossas afeições centrais. Esse é um conceito crucial que equilibra muitas das expectativas irreais impostas pela mídia e pela cultura quando buscamos um companheiro para a vida.
Ellen White também apresentou um teste simples que pode revelar se o amor verdadeiro está florescendo em um relacionamento. Se notarmos que estamos perdendo o interesse nas questões espirituais, é provável que uma paixão desequilibrada, e não o amor genuíno, esteja impulsionando a relação. Um relacionamento que nos aproxima de Deus, permitindo que ambos os parceiros adorem o Senhor juntos, constitui um sólido ponto de partida para o crescimento do amor.
Possivelmente, a realidade mais triste em relação aos escritos de Ellen White seja o fato de que muitas pessoas os consideram irrelevantes mesmo antes de lerem. O espaço não nos permite abarcar todas as contribuições valiosas que ela fez em favor da busca por um parceiro matrimonial que nos enriqueça, em vez de nos diminuir. A única maneira de descobrir essas ideias e princípios é se dedicar pessoalmente a explorar os conselhos da autora.
CHANTAL KLINGBEIL atuou como diretora associada do Patrimônio Literário de Ellen G. White por mais de dez anos e atualmente vive na Alemanha
(Artigo publicado na edição de outubro/2023 da Revista Adventista / Adventist World)
Última atualização em 10 de outubro de 2023 por Márcio Tonetti.