A história das reuniões campais precede o surgimento da igreja
David Trimm
A “reunião campal” pode parecer um evento tipicamente adventista. Afinal, o que poderia ser mais natural, ou, de fato, mais adventista, do que sair das casas ou apartamentos e acampar numa região afastada dos grandes centros urbanos, isolados do mundo, de suas distrações e tentações, e desfrutar de comunhão e adoração, cercados pelas belezas da criação de Deus?
No entanto, as reuniões campais são anteriores ao nascimento da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Elas surgiram nas regiões remotas dos Estados Unidos, num período em que os colonos viviam a distâncias consideráveis uns dos outros. A primeira reunião campal de que se tem notícia foi realizada por presbiterianos no estado norte-americano de Kentucky, em 1800. Um ano depois, outra reunião campal presbiteriana, no mesmo estado, contou com a presença de mais de 10 mil pessoas, e a ideia rapidamente se espalhou entre os metodistas e adeptos de outras denominações. No verão do Hemisfério Norte, as reuniões campais frequentemente competiam umas com as outras.
ASSIMILAÇÃO
Os fundadores da Igreja Adventista do Sétimo Dia cresceram com as reuniões campais, e os mileritas já as haviam adotado com grande entusiasmo. Porém, inicialmente, os pioneiros do adventismo viam esses eventos com cautela. Uma das razões era o histórico negativo de algumas campais realizadas por outras denominações, nas quais o livre consumo de bebidas alcoólicas favorecia comportamentos desordeiros. Nessa época, esses encontros haviam se tornado muito populares na cultura norte-americana, sendo promovidos por diversas confissões religiosas e reunindo pessoas de todas as classes sociais.
Por já utilizarem tendas regularmente para fins evangelísticos, os adventistas estavam familiarizados com o formato das reuniões campais. Por exemplo, em 1867, a assembleia da Associação de Wisconsin foi realizada em um acampamento, reunindo 300 pessoas. Como resultado, os líderes da igreja, sob a orientação de Ellen White, decidiram aderir à ideia das reuniões campais.
A sexta assembleia da Associação Geral, realizada em maio de 1868, em Battle Creek, Michigan, tomou uma decisão sobre o assunto, talvez porque alguns adventistas ainda tivessem receio de se envolver em reuniões campais. Foi recomendada a realização anual de uma “reunião campal geral, na época das assembleias de trabalho das nossas Associações”, que se estendesse por alguns dias, sendo realizada “em um ambiente rural ou semirrural, com a possibilidade de acampamento no local” (para saber mais, clique aqui).
Assim, a primeira reunião campal realizada oficialmente pela Igreja Adventista do Sétimo Dia foi a da Associação de Michigan, na região de Wright, em setembro de 1868. Na década de 1880, a temporada das campais já era amplamente reconhecida na América do Norte e mencionada como tal nos periódicos da igreja. Mas e quanto às campais fora dos Estados Unidos?
ENVOLVIMENTO INTERNACIONAL
A primeira reunião campal realizada na Inglaterra ocorreu em 31 de maio de 1807, perto de Stoke-on-Trent, e foi organizada pelos metodistas, influenciada especialmente por Lorenzo Dow, um pregador carismático e controverso avivalista norte-americano. Apesar de alguns líderes da denominação considerarem essas reuniões questionáveis, houve adesão de um grupo. Isso resultou, inclusive, na formação de uma nova denominação, composta pelos chamados metodistas primitivos.
No entanto, as reuniões campais não prosperaram na Inglaterra e, 80 anos depois, esse conceito era estranho para os súditos da rainha Vitória. Por essa razão, os missionários adventistas norte-americanos enviados para lá na década de 1880 tiveram que trabalhar muito para convencer os ingleses da importância das campais. Em 1884, o The Present Truth (A Verdade Presente) noticiou uma série de reuniões campais dos adventistas do sétimo dia no Missouri, Minnesota, Tennessee e na Califórnia, nos Estados Unidos. A publicação destacou que “a maior reunião já realizada em Michigan” havia ocorrido na cidade de Jackson nos dias 18 a 30 de setembro, e que “seria uma visão nova” para os leitores ingleses “observarem um desses acampamentos” (para saber mais, clique aqui). Sem dúvida, os leitores britânicos teriam ficado surpresos com a forma como a reunião na tenda foi realizada.
Outro relato da versão do The Present Truth impressa na Inglaterra observou: “Um telefone nos conecta com a cidade e com o mundo. A água é fornecida por meio de canos da estação de tratamento de água da cidade […]. Uma barraca de provisões e uma tenda de hospedagem fornecem comida a um custo acessível para aqueles que a desejam. Uma agência dos correios recebe e distribui correspondências” (link.cpb.com.br/3eb272). Tudo isso era facilitado pelo clima quente e seco com o qual geralmente se podia contar no verão nos Estados Unidos, ao contrário da Inglaterra.
A primeira reunião campal adventista realizada fora dos Estados Unidos aconteceu no Canadá, em 1879. Menos de uma década depois, a primeira campal fora da América do Norte foi realizada em Moss, no leste da Noruega, em junho de 1887. Ellen White e William, um de seus filhos, que estavam visitando a Europa, participaram desse encontro. A pioneira pode ser vista à esquerda em uma foto dos participantes. A campal em Moss foi promovida com o intuito de ser um evento para todos os adventistas da Europa.
Essa campal foi considerada uma “grande bênção para a igreja e para a causa em geral”, conforme foi descrito em um relatório. No verão seguinte, em 1888, a Associação da Europa Central organizou sua primeira reunião campal, em Upper Tramelan, na Suíça, que também teve uma “grande participação, tanto dos adventistas quanto do povo em geral” (para saber mais, clique aqui).
Depois disso, as reuniões campais espalharam-se pela Europa e por outros continentes, tornando-se eventos regulares. Na América do Norte, todas as Associações nos Estados Unidos e no Canadá também passaram a realizar suas reuniões campais anualmente. Assim, elas realmente se tornaram parte da cultura adventista.
DAVID TRIM é diretor do departamento de Pesquisa, Estatística e Arquivos da Associação Geral, em Silver Spring, Maryland (EUA)
(Artigo publicado na Revista Adventista / Adventist World de junho/2024)
Última atualização em 2 de setembro de 2024 por Márcio Tonetti.