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A importância do culto familiar em lares de crianças com necessidades especiais

Dalmo Dion Costa Lima

Foto: Adobe Stock

Nenhum casal está preparado para lidar com os desafios de uma criança com necessidades especiais. A chegada de um novo membro na família já traz grandes mudanças e impactos. Porém, por mais organizada e financeiramente estável que a família seja, por mais tempo de convivência, união e boa performance psicossocial que tenha, ao descobrir uma necessidade especial em seu filho, sofre maior impacto emocional e social. E a aceitação dessa nova dinâmica familiar depende de diversos fatores, como a história de cada membro familiar, suas crenças, seus preconceitos e valores.

Famílias que enfrentam essas situações, independentemente das características da deficiência, podem enfrentar uma série de dificuldades, como sentimento de culpa, ansiedade e raiva. A passagem por diversos profissionais também gera, muitas vezes, sentimento de frustração devido às falsas esperanças e à demora nos diagnósticos. E saber lidar com essas emoções é um grande desafio para os pais e familiares. A espera pode ser longa e penosa, tornando importante a presença de uma rede de apoio ou suporte social, emocional e cognitivo. É nesse ponto também que o auxílio espiritual e a fé apresentam-se como um importante método de auxílio a essas famílias para promover a união, amenizar o sofrimento, a dor, a ansiedade e a depressão, além de criar esperança.

Vínculo sagrado

Segundo Ellen White, “o vínculo de família é o mais íntimo, o mais afetuoso e sagrado de todos na Terra. Foi designado para ser uma bênção à humanidade” (A Ciência do Bom Viver [CPB, 2021], p. 221). E diversos estudiosos modernos destacam que é na convivência familiar que aprendemos a respeitar, partilhar, ter compromisso, desenvolver disciplina e administrar conflitos. Nara Liana Pereira Silva e Maria Auxiliadora Dessen, por exemplo, destacaram em seu trabalho sobre crianças com Síndrome de Down que “as interações estabelecidas no microssistema família são as que trazem implicações mais significativas para o desenvolvimento da criança” (Psicologia: Reflexão e Crítica 16 [2003], p. 503).

Se a família desempenha um papel tão importante na formação dos indivíduos, algumas atividades precisam ser realizadas para fortalecer os laços e potencializar os benefícios do vínculo familiar. E uma atividade sugerida para famílias cristãs que pode auxiliar nesse processo é o culto familiar.

O culto doméstico é um encontro diário com todos os membros que ocorre em lares cristãos e que compreende um programa simples com músicas, oração e estudo da Bíblia. Ele tem um importante papel na integração da família e no crescimento espiritual das pessoas, promovendo muitas vezes um forte vínculo entre pais e filhos, algo que nenhuma outra atividade poderá oferecer.

É na hora do culto doméstico que o diálogo acontece. Durante o culto, a família tem a oportunidade de conversar e criar vínculos mais profundos. É quando muitas vezes as mágoas e brigas se dissipam, e os pais e filhos tornando-se mais conhecidos uns dos outros e todos de Deus.

Porém, as crianças com necessidades especiais requerem cuidados e atividades específicas de acordo com suas carências. Essas necessidades devem ser atendidas inclusive durante a realização do culto familiar, para que esse momento seja prazeroso, feliz e alcance os objetivos em relação a todos os membros do lar.

A regularidade do culto familiar é um fator muito importante. Crianças com desenvolvimento regular precisam seguir uma rotina, pois os hábitos repetitivos ajudam no equilíbrio emocional. E isso não é diferente em relação às crianças com necessidades especiais, principalmente aquelas com algum transtorno ou síndrome que afetam a área cognitiva/intelectual. Estudos comprovam que essas crianças vivem melhor quando existe uma regularidade de suas atividades, e a quebra dessas rotinas afetam o seu desenvolvimento.

O culto familiar fortalece a unidade, ajuda na construção da felicidade, promove um forte vínculo, melhora o diálogo e ajuda no desenvolvimento e na maturidade dos filhos

Além disso, o brincar com os portadores de necessidade especiais “é um instrumento que fornece a experiência necessária ao seu desenvolvimento motor, sensorial, perceptual, cognitivo, afetivo e cultural”, afirmou Fernando H. Sousa no artigo “A importância do brincar nas atividades físicas para portadores de necessidades especiais” (Conexões 9 [2011], p. 157). O brincar com essas crianças “é uma forma de criar e fortalecer vínculos”, tornando possível a “expressão de sentimentos, preferências, receios e hábitos”, acrescenta o autor (p. 159).

Sousa completa: “A partir da brincadeira a criança torna-se espontânea, desenvolve-se e revela-se de maneira transparente na vida lúdica, brinca por necessidade interior, e prepara-se para a maturidade. A criança não brinca por brincar, sendo que o próprio brinquedo mostra o caminho escolhido por ela, pelo qual devemos aproveitar e trabalhar” (p. 160).

Ambiente agradável

Durante o culto familiar, a criatividade e a alegria devem estar presentes. De acordo com Ellen White, o culto familiar deve ser “a prática mais interessante e agradável da vida no lar”, um momento “breve e cheio de vida, adaptado à ocasião, e variado de tempo em tempo”, e “deve ser o alvo principal dos chefes da família” (Orientação da Criança [CPB, 2021], p. 362, 363).

Na revista Reparando Brechas, preparada pelos ministérios da Criança e da Família da Divisão Sul-Americana em 2018 e disponível na internet, afirma-se que “é preciso envidar esforços para que o culto familiar seja atrativo, agradável, reverente, ordeiro, relevante, propício a uma experiência significativa com Deus para cada membro da família”. Nesse material há várias sugestões de cultos criativos.

Outra característica importante no culto familiar é o tempo de duração. As crianças, incluindo as com necessidades especiais, naturalmente são mais agitadas, sendo a distração algo comum. Elas podem ser distraídas com facilidade, e o tempo de interesse é curto. A atividade deve respeitar esse limite. Um culto curto, criativo e espiritual de 10 a 15 minutos é suficiente.

A presença de músicas também é uma prática relevante. Ela atua como reforço no desenvolvimento linguístico, cognitivo, socioafetivo, psicomotor, de sensibilidade, imaginação, memória, concentração, atenção e autodisciplina, entre outros aspectos. Para o professor e músico Eli Prates, “a música deve ser planejada tanto quanto a oração para o culto familiar”, uma vez que ela “poderá ser o fator que marcará mensagens na memória de adultos, jovens ou crianças que nenhuma outra forma de comunicação poderá fazê-lo”. A frase faz parte do artigo “A música e os anjos no culto familiar”, publicado na revista Família Esperança, preparada pelo Ministério da Família da Divisão Sul-Americana e que igualmente contém várias dicas úteis para o culto (clique aqui para ver).

No culto com a criança, diz a psicopedagoga Juliana Miranda Damasceno na mesma revista, “os princípios cristãos devem ser embutidos nas histórias e reforçados em conversas do dia a dia”. Não basta entregar para a criança um tablet ou revista com músicas e desenhos. É preciso intencionalidade no ensino. “Devem ser levados em consideração os quatro estilos de aprendizagem: auditiva (ouvindo), visual (observando), sinestésica (com estímulos táteis ou movimentos corporais), artística (desenhando, dramatizando, cantando).”

Muito mais sobre esse tema poderia ser abordado. No entanto, não podemos esquecer que o culto familiar é importante para qualquer família cristã e deve estar presente em nossos lares diariamente. Em uma família que recebe um novo membro com necessidades especiais, o culto, se bem realizado e com atividades envolventes e práticas, torna-se um importante auxílio. Ele fortalece a unidade da família, ajuda na construção da felicidade do lar, promove um forte vínculo, melhora o diálogo entre os membros da família e Deus, e ajuda no desenvolvimento e na maturidade dos filhos.

DALMO DION COSTA LIMA, graduado em Teologia e Pedagogia pelo Unasp, é especialista em Neuropsicopedagogia e atua como pastor escolar no Colégio Adventista do Partenon, em Porto Alegre (RS)

Última atualização em 11 de outubro de 2022 por Márcio Tonetti.