Mães que se alimentam mal durante a gestação podem “programar” doenças nos filhos
O impacto das escolhas da mãe sobre o desenvolvimento do bebê tem sido vastamente pesquisado por estudiosos em todo o mundo. Mas o que, afinal, pode acontecer com esse bebê quando for adulto? Que tipo de doenças ele pode desenvolver? E mais, até que ponto alterar o estilo de vida somente no período gestacional contribui para a saúde e o desenvolvimento do feto?
Há mais de 15 anos, o pesquisador James Armitage, professor na Universidade Deakin, na Austrália, tem buscado respostas para essas perguntas. O interesse pelo tema cresceu ao cursar o PhD. Na época, ele descobriu que bebês que receberam a quantidade ideal de Ômega 3 no período gestacional, mesmo sem o consumo regular posterior, estavam mais protegidos.
Armitage estuda a chamada “programação cardiometabólica”, termo usado para exemplificar como o metabolismo será na vida adulta em função dos estímulos ou insultos que recebemos na fase gestacional.
Durante uma palestra proferida no Instituto Adventista Paranaense (IAP) na última segunda-feira, 6 de março, o australiano apresentou algumas hipóteses do estudo realizado em parceria com pesquisadores da Universidade Estadual de Maringá (UEM), entre eles a professora do IAP, Kesia Palma Rigo, doutora em Fisiologia.
Baixa nutricional
O estudo de fatores ambientais que podem alterar a maneira como os genes são expressos é discutido há décadas. Em 1980, o pesquisador inglês David Barker correlacionou as mortes por doenças cardiovasculares em diferentes regiões da Inglaterra com o peso dos indivíduos ao nascer. Ele observou que, entre pessoas que tinham nascido com peso menor, havia maior índice de mortes por doença cardiovascular. Uma comprovação dos estudos realizados após a II Guerra Mundial.
No período em que a Alemanha bloqueou todos os portos e caminhos que davam acesso à Holanda, bem como à Polônia, Noruega e Dinamarca, a entrada de alimentos nesses países era limitada, o que forçou a população a ingerir apenas um terço da quantidade ideal de calorias necessárias por dia.
Estudos pós-guerra, realizados com os filhos dessas gestantes, mostraram a prevalência de doenças cardiovasculares. “Esses princípios apontam para um mecanismo mais amplo. Mulheres que se alimentaram melhor e mantiveram um estilo de vida saudável no período mínimo entre nove e seis meses antes da gestação terão filhos com menor probabilidade de desenvolver doenças cardiovasculares”, Armitage sublinha.
No entanto, como ele lembra, as pesquisas não se limitam à alimentação. Outros fatores podem contribuir para a programação cardiometabólica. Um exemplo citado por Armitage é o de gestantes que praticam exercícios físicos regularmente e têm filhos com menor propensão à obesidade.
Contudo, a Dra. Kesia Rigo esclarece que, quando se fala em “programação de doenças”, não quer dizer que a pessoa determinantemente sofrerá dessas enfermidades na fase adulta, mas que o risco de contraí-las será maior. “Ao identificar essa propensão, o indivíduo deve se alimentar melhor, praticar exercícios físicos e não se expor a situações de estresse. Com isso ele diminuirá a probabilidade de desenvolver doenças”, ressalta.
Informação como prevenção
James Armitage defende que o grande problema é a falta de informação sobre o assunto. “Nem todos sabem que a estrutura básica do ser humano é desenvolvida no útero e que o desenvolvimento da criança pode ser alterado por diversos fatores. Isso envolve tanto a falta quanto o excesso de comida, o que fará com que a criança cresça sem os nutrientes necessários para a saúde na fase adulta”, exemplifica, destacando a importância de as futuras mamães buscarem mais informações.
Kesia, que além de pesquisadora é mãe, acrescenta que também é preciso ter cuidado com determinadas práticas instituídas pela indústria, como a criação de fórmulas, papinhas e vitaminas que prometem melhorar o desenvolvimento e aumentar a imunidade das crianças.
Para saber +
Por décadas, acreditava-se que apenas os genes fossem os responsáveis por transmitir informações biológicas para as próximas gerações. Mas isso mudou. Hoje, os cientistas consideram que as variações não-genéticas, adquiridas no decorrer da vida, também podem ser transmitidas aos descendentes. O nome dado a essas variações é epigenética. Saiba mais na reportagem “O X da questão”, publicada pela revista Vida e Saúde.
CAROLINA PEREZ é assessora de comunicação do Instituto Adventista Paranaense (IAP)
Última atualização em 16 de outubro de 2017 por Márcio Tonetti.