Marcas da pós-modernidade

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As influências atuais que têm moldado a juventude

Rafael Stehling

Imagem generativa: Renan Martin

Vez ou outra, ouvimos alguém dizer: “Esta geração é muito mimimi, não quer saber de compromisso. Os jovens estão saindo da igreja!” O que tem formado os adolescentes e jovens de hoje? Quais influências estão por trás dos comportamentos e valores desta geração?

A juventude tem sido impactada por diferentes influências. Para facilitar a compreensão do tema, destaco quatro delas: a mentalidade do fast-food, o capital da influência, o consumo colaborativo
e o poder das telas.

Mentalidade do fast-food

O que comemos e bebemos influencia diretamente quem somos. Nunca houve uma geração tão mal alimentada e dependente de produtos artificiais como a atual. No passado, os desafios eram outros. O acesso a uma variedade de frutas, verduras e legumes era mais difícil. Com o tempo, os mercados trouxeram variedade. Porém, junto dela vieram os salgadinhos, os biscoitos cheios de gordura e açúcar, as bebidas coloridas e gaseificadas, os energéticos, o macarrão instantâneo no almoço e creme de avelã no jantar. Diante disso, quais expectativas podemos ter de uma geração que está sendo construída com esses “ingredientes”?

É claro que existem casos que exigem adaptações. Há uma diferença entre o ideal e o real. Há quem abra exceções e quem transforme o fast-food em rotina. No entanto, os extremos sempre são perigosos, e por isso precisamos buscar o equilíbrio.

Também é importante lembrar que cada pessoa enfrenta suas próprias batalhas na busca por uma vida saudável. Devemos respeitar as diferenças individuais e reconhecer que vivemos em um mundo diferente do passado. A comida caseira feita pela mãe, o arroz e o feijão preparados na hora e a verdura tirada diretamente da horta tornaram­- se raridades na correria do mundo pós-moderno.

É importante observar que a cultura do fast-food vai além da alimentação; ela representa o estilo de vida de uma sociedade que valoriza a rapidez e a conveniência em detrimento da qualidade e da profundidade (Eric Schlosser, Fast Food Nation [Houghton Mifflin, 2001]).

Aos poucos, temos visto crescer uma geração apressada e imediatista, que não tem paciência para cozinhar, esperar o fermento agir ou assar o alimento. Pedir comida por um aplicativo é muito mais rápido. Porém, essa pressa afeta outras áreas da vida, que exigem tempo, espera e paciência para se desenvolverem.

A cultura do fast-food impacta nossa saúde não apenas pelo que comemos, mas também por transformar nossa percepção do tempo. A busca incessante por conveniência e rapidez acaba comprometendo a qualidade de vida e enfraquecendo nossas relações pessoais.

Há satisfação em preparar algo para comer. Fazer uma refeição é um exercício valioso para fortalecer a dinâmica familiar, promover a realização pessoal e cultivar a paciência.

O capital da influência

Quem são as referências desta geração? Uma marca da pós-modernidade é a desconfiança em relação às autoridades tradicionais. Desse modo, quem exerce influência sobre os jovens? Seriam os políticos? Os militares? Os líderes religiosos? Ou, talvez, os artistas?

De fato, não há uma única influência dominante. Alguns admiram certas figuras públicas; outros, referências completamente diferentes. Além dessa crise de bons modelos, as redes sociais, como o YouTube e o TikTok, deram voz e visibilidade a muitos que não têm conteúdo nem preparo para serem exemplos dignos de seguir.

No meio dessa confusão de referências, muitos jovens escolhem seguir este ou aquele indivíduo simplesmente por identificação ou por perceberem nele uma aparente autenticidade. Assim, passam a acreditar em suas ideias, muitas vezes ignorando até mesmo a razão.

Os influenciadores digitais desempenham um papel crucial na formação das opiniões e dos comportamentos das novas gerações (Crystal Abidin, Internet Celebrity [Emerald Publishing Limited, 2018]). Eles representam um novo tipo de liderança e autoridade, fundamentado no quanto são populares e em seu alcance na internet, muitas vezes exercendo mais influência do que professores, pastores ou líderes comunitários.

Alguns influencers chegam a lançar desafios que colocam vidas em risco apenas para ganharem curtidas. Muitos também publicam vídeos editados que fazem seus seguidores acreditarem que suas ações não têm consequências. Não é por acaso que frequentemente vemos notícias de adolescentes se envolvendo em ações perigosas, insensatas e extremas.

Também observamos que essa cultura ensina a buscar validação e sucesso nas redes sociais, moldando aspirações e comportamentos. O cuidado excessivo com a imagem pessoal, a pressão por curtidas e seguidores e os efeitos psicológicos de viver em um mundo em que a popularidade on-line parece valer mais que a vida real cobram um alto preço.

Diante desses excessos, não surpreende que muitos adolescentes e jovens, mesmo dentro da igreja, não se intimidem ao contestar o pastor, o ancião ou a liderança.

Por outro lado, há um aspecto positivo nisso. Esta geração valoriza a autenticidade. Portanto, um líder verdadeiro, que se relaciona com franqueza e não usa sua posição para tirar vantagem, conquistará o coração dos jovens. Deixemos que sejam questionadores! Quem tem a verdade ao seu lado e busca viver de forma autêntica será uma referência positiva.

Consumo colaborativo

Se antes o brinquedo era consertado e passado para o irmão mais novo, hoje a novidade é alugar brinquedos mensalmente para evitar o tédio.

É claro que a locação permite o acesso a diversos produtos por uma fração do valor de compra, oferecendo um bom custo-benefício. Além disso, ao optar pela locação, o mesmo brinquedo pode ser utilizado por várias famílias, gerando menos lixo e promovendo a sustentabilidade.

No entanto, será que no passado não havia benefícios na espera pelo presente especial que chegava só em determinada data comemorativa? Será que o cuidado com o brinquedo não ensinava valores importantes?

Um cenário de fartura não gera necessariamente segurança. Esta geração tem se acostumado ao crescente número de opções de “empréstimo” de bens, e isso também se reflete em seus relacionamentos e na forma como lidam com as pessoas. Não é por acaso o crescente desprezo pela família tradicional. A cada dia, observamos o aumento da banalização do casamento monogâmico e dos valores que antes eram considerados imutáveis.

Impaciência, tédio e ansiedade fazem parte do mundo atual. Assim como se troca um brinquedo ou um jogo, não é difícil encontrar jovens que desistem de lutar pelo casamento, que se entediam na faculdade ou que ficam ansiosos para trocar de emprego.

O acesso rápido e fácil a tantas opções também trouxe dificuldades para lidar com o “não”. A variedade de prazeres disponíveis com um simples clique tem feito até mesmo as buscas por relacionamentos românticos diminuírem, dando origem a comportamentos como a agamia, uma nova forma de relacionamento caracterizada pelo desejo de não ter parceiros fixos nem filhos.

Em realidade, a cultura do compartilhamento reflete uma mudança na forma como os jovens percebem a posse e o valor das coisas (Rachel Botsman e Roo Rogers, What’s Mine Is Yours [HarperCollins, 2010]). A preferência pelo uso temporário em vez da propriedade permanente revela uma atitude mais flexível e menos apegada aos bens materiais, algo que pode se estender também a outras áreas da vida. Embora essa tendência apresente vantagens, ela também pode trazer desvantagens, ao romper os limites dos hábitos de consumo e moldar a percepção dos relacionamentos e das crenças.

Poder das telas

Dedinhos inquietos deslizam pela tela, descartando conteúdo com a facilidade de um toque. Não há critério, parâmetro ou tempo para avaliar o que se vê. Apressados, aceleram o áudio, sem espaço para a reflexão. Abrem um aplicativo e, em poucos segundos, transitam de um conteúdo espiritual para uma piada, de uma reflexão filosófica para uma receita, de animais engraçados para uma nova tendência. Tudo ao mesmo tempo: rápido, fragmentado e superficial.

As consequências para esta geração, que cresce acostumada à rolagem incessante das telas, incluem a dificuldade de prestar atenção em discursos longos e pausados sobre um único tema, além da dificuldade de realizar análises profundas.

É motivador ver meninos e meni­nas que, mesmo imersos em uma cultura tão diversa, veloz e desafiadora, continuam encon­trando beleza e sentido no evangelho eterno

Dia a dia, presenciamos conversas cada vez mais rasas, juízos apressados e conclusões precipitadas entre os mais jovens. Soma-se a isso a dificuldade em desenvolver um raciocínio lógico e bem estruturado, uma consequência da quantidade de informações fragmentadas e consumidas sem reflexão.

A rolagem infinita nas telas tem moldado a forma como os jovens consomem conteúdo e se relacionam com o mundo (Nicholas Carr, The Shallows [W. W. Norton & Company, 2011]). Esse hábito pode gerar uma atenção fragmentada e superficial, comprometendo a capacidade de concentração e de reflexão profunda.

Olhar de esperança

Vivemos tempos de grandes transformações. Se antes as possibilidades profissionais pareciam se concentrar em áreas tradicionais como o magistério, o direito, a medicina ou a engenharia, hoje somos convidados a contemplar um horizonte mais amplo e diverso. Caminhos como o empreendedorismo, a atuação nas redes sociais e a criação de conteúdo digital têm se apresentado como opção vocacional para muitos jovens.

Ao olharmos para essas mudanças, é importante também reconhecer os avanços na tecnologia e refletir sobre como esses recursos influenciam a formação das novas gerações. Ainda que não tenhamos todas as respostas, especialmente quanto aos efeitos de dispositivos móveis ou da exposição constante a estímulos digitais, é possível cultivar uma postura prudente, guiada pelo discernimento e pelo cuidado com o desenvolvimento integral das crianças e adolescentes.

No campo das escolhas cotidianas, a abundância também é uma marca dos nossos dias. A variedade é tamanha que, com apenas alguns toques em um aparelho, um jovem pode acessar diferentes paisagens do mundo ou explorar múltiplas formas de entretenimento, cada uma com seus próprios protagonistas, referências e valores.

Diante da pergunta que às vezes ouvimos: “Por que tantos jovens estão deixando a igreja?”, talvez devêssemos nos permitir outra reflexão: como é maravilhoso ainda termos tantos jovens entre nós! Vemos meninos e meninas que, mesmo imersos em uma cultura tão diversa, veloz e desafiadora, continuam encontrando beleza e sentido no evangelho eterno.

A igreja e sua liderança são chamadas a serem mais do que guardiãs da doutrina: devem ser um refúgio seguro, uma casa onde o amor abre portas e a escuta gera pontes. É preciso aproximar­-se com carinho, aconselhar com ternura, amar sem exigir perfeição e, sobretudo, acreditar que Deus continua agindo na vida de cada jovem, mesmo quando os passos parecem incertos.

Para aqueles que, por vezes, confundem aceitação com concordância, vale lembrar uma sábia orientação de Ellen White: “Os que esperam ter sucesso na educação dos jovens devem aceitá-­los como são, não como deviam ser nem como serão quando saírem de sob sua instrução” (Testemunhos Para a Igreja [CPB, 2021], v. 4, p. 364). É nesse espírito de acolhimento que floresce a verdadeira transformação, guiada pelo Espírito e sustentada pela graça.

Ainda que o desafio de conduzir esta geração ao caminho da salvação e do serviço pareça grande, especialmente em um tempo marcado por valores confusos e distantes do ideal divino, há uma esperança que jamais falha. Não estamos sozinhos nessa missão. Como afirmou Ellen White: “O que se deve fazer para salvar nossos jovens? Nós podemos fazer pouco, mas Deus vive e reina, e Ele pode fazer muito. Os jovens são nossa esperança para a obra missionária” (Fundamentos da Educação Cristã [CPB, 2025], p. 252). O poder de Deus continua atuante, e é Ele quem transforma corações, sustenta decisões e acende vocações no meio da juventude.

Que as novas gerações encontrem no lar e na igreja homens e mulheres de oração: pessoas comprometidas com Deus, dispostas a caminhar ao lado da juventude com sabedoria, paciência e amor. Em tempos de incertezas, torna-se essencial que a comunidade de fé seja um espaço seguro e acolhedor, onde os jovens se sintam acompanhados, valorizados e inspirados a crescer espiritualmente. Quando líderes e famílias se colocam como parceiros na caminhada espiritual, a influência do Céu se torna visível, e os corações jovens se abrem para ouvir a voz de Deus e responder ao Seu chamado com coragem e alegria. 

RAFAEL STEHLING é líder de Jovens e Universitários na Associação Rio de Janeiro

(Artigo publicado na Revista Adventista de setembro/2025)

Última atualização em 18 de setembro de 2025 por Márcio Tonetti.