A frase em alemão que foi encoberta na parede de um templo adventista de Santa Catarina na II Guerra Mundial e que, sete décadas depois, veio novamente à tona durante uma reforma
RENATO GROSS
Em julho de 1897, na pequenina cidade de Alto Benedito Novo, no interior de Santa Catarina, nascia uma florescente igreja, considerada uma das dez primeiras congregações adventistas estabelecidas no Brasil. Organizada por Huldreich F. Graf (1855-1946), primeiro pastor enviado oficialmente pela sede mundial da denominação para trabalhar em nosso país, há mais de 120 anos ela funciona no mesmo lugar, tem um número expressivo de membros e, anualmente, celebra seu aniversário, sempre rememorando suas origens, tradições e fé inabalável nas três mensagens de Apocalipse 14.
Já no ano seguinte ao da organização da Igreja de Alto Benedito Novo, essa comunidade adventista decidiu abrir uma escola paroquial, cujo objetivo era oferecer uma educação fundamentada nos princípios bíblicos. Desse modo, crenças fundamentais como a segunda vinda de Cristo e a observância do sábado faziam parte do currículo. Essa escola funcionou na sala da casa do meu avô, Samuel Gross, imigrante alemão luterano que foi batizado pouco tempo depois de o adventismo ter chegado à localidade, que fica próxima de Gaspar Alto, onde foi fundada a primeira igreja adventista em solo brasileiro.
Por ser uma região de colonização alemã, as aulas e todos os serviços religiosos eram realizados no idioma alemão. Tudo ia muito bem. O número de matrículas crescia e o de novos conversos à fé adventista, também. No entanto, a situação se tornou crítica com a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial, e a declaração brasileira de guerra à Alemanha. O idioma germânico foi proibido. As aulas e os cultos passaram a ser feitos obrigatoriamente em português. A história registra que, nessa época, muitos de nossos pastores e professores de origem alemã foram perseguidos e presos.
O tempo passou… Décadas mais tarde, durante os preparativos para a celebração de mais um aniversário de organização daquele templo, alguém lembrou que os membros mais velhos costumam dizer que havia algumas letras (talvez um versículo bíblico) escondidas na parede de alvenaria que separava o auditório do espaço em que ficava a sala pastoral e o púlpito.
Como estava prevista uma nova pintura interna, resolveram averiguar aquilo que estava na memória dos antigos. Então, uma cuidadosa raspagem do reboco começou a ser feita. E, finalmente, uma a uma começaram a surgir, trabalhadas em um perfeito alemão gótico, com letras em baixo relevo, formando a seguinte frase: “Temei a Deus e dai-lhe glória, pois é chegada a hora do seu juízo”.
Por que isso foi encoberto na época? Provavelmente, temendo represálias por causa da sua indisfarçada origem germânica, os líderes da igreja tenham resolvido apagar a “prova”, ainda mais por se tratar de um versículo bíblico que falava em “juízo”. Mas depois de aproximadamente sete décadas, essa mensagem foi redescoberta. E hoje ela continua lá! Quem entra na bonita nave do templo adventista de Alto Benedito Novo pode apreciá-la e ser advertido por esse solene apelo.
Resolvi contar esta história inspirado na edição de março de 2021 da Revista Adventista, que mostrou o movimento recente, iniciado pelos membros leigos norte-americanos e apoiado pela Associação Geral, no sentido de voltar a dar o destaque que nossos pioneiros deram ao capítulo 14 do Apocalipse. É exatamente o que nos instrui o Pentateuco: a rememoração do passado, transmitindo-o às novas gerações. Maranata!
RENATO GROSS é professor universitário aposentado, escritor e pesquisador da história da Educação Adventista
Última atualização em 8 de abril de 2021 por Márcio Tonetti.