Panorama do fim

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A relevância do livro O Grande Conflito para a escatologia adventista

Emilson dos Reis

Crédito da imagem: Adobe Stock e CPB

De modo geral, para os adventistas do sétimo dia, a expressão “o grande conflito” tem pelo menos três significados: (1) refere-se a uma série de cinco livros escritos por Ellen White; (2) indica o nome do quinto livro dessa série; (3) trata-se de uma das 28 crenças fundamentais da denominação.

Como ocorre com todo ensinamento da Igreja Adventista, a compreensão sobre o grande conflito está fundamentada na Bíblia. Entre os diversos textos que iluminam a compreensão do tema, é possível mencionar Apocalipse 12:7 e Efésios 6:2. O primeiro apresenta a origem do conflito no Céu, e o segundo mostra como ele afeta nossa vida na Terra.

Apesar dessas informações estarem disponíveis nas Escrituras, é provável que não tivéssemos compreendido a importância e magnitude desse conflito se Deus não tivesse chamado nossa atenção por meio dos escritos de Ellen White, especialmente da metanarrativa descrita na série Conflito.

MINISTÉRIO DO ESPÍRITO SANTO

O Espírito Santo é um participante ativo no contexto do grande conflito. Ele inspirou homens santos para que escrevessem a Palavra de Deus (2Pe 1:20, 21). Isso não significa que tudo o que foi escrito lhes foi revelado por meio de sonhos e visões, mas que o Espírito supervisionou o processo de redação e chancelou o conteúdo final. Paulo explicou que Deus falou muitas vezes e de diferentes maneiras aos seres humanos por intermédio dos profetas (Hb 1:1, 2).

Esse mesmo Espírito foi prometido por Jesus para revelar coisas que Cristo não havia revelado durante Seu ministério terrestre e iluminar nossa mente a fim de compreendermos toda a verdade. Em João 16:12, Ele afirmou: “Tenho ainda muito para lhes dizer, mas vocês não o podem suportar agora.” Portanto, Jesus ensinou o essencial, mas não tudo. Posteriormente, Ele continuaria a revelar-Se à Sua igreja, mostrando aquilo que não havia dito em Seu ministério terrestre – ensinos que não estão escritos nos quatro evangelhos – e faria isso mediante o Espírito Santo. A esse respeito, Jesus disse: “Ele não falará por Si mesmo, mas dirá tudo o que ouvir e anunciará a vocês as coisas que estão para acontecer. Ele Me glorificará, porque vai receber do que é Meu e anunciará isso a vocês” (Jo 16:13, 14).

E como o Espírito faz isso? Especialmente por meio do dom de profecia, presente ao longo das Escrituras. O Antigo Testamento apresenta a vida, a obra e os ensinos de dezenas de profetas. Por sua vez, o Novo Testamento explica com mais detalhes a doutrina dos dons espirituais e menciona o dom de profecia como um dos mais destacados (Rm 12:4-8; Ef 4:11-13; 1Co 12:8-10, 28). Entre aqueles que receberam o ofício profético nos dias apostólicos estão Paulo, autor com mais livros no Novo Testamento, e João, que escreveu o livro do Apocalipse e registrou a identificação que um anjo fez entre o “testemunho de Jesus” e o “Espírito da profecia” (Ap 19:10), ou seja, o dom profético.

O TEMA DO GRANDE CONFLITO APONTA PARA O FIM DO PECADO E DO MAL EM TODAS AS SUAS FORMAS

Essa é uma informação importante, porque uma das marcas da igreja remanescente no tempo do fim é a manifestação profética em seu meio (Ap 12:17; cf. 19:10). Como adventistas do sétimo dia, cremos que isso foi cumprido no ministério de Ellen White. Ao estabelecer a relação entre a Bíblia e seus escritos, que em sua época eram conhecidos como “testemunhos”, ela observou: “Os testemunhos do Espírito de Deus são dados para dirigir os homens à Sua Palavra, que tem sido negligenciada” e “pouca atenção é dada à Bíblia, e o Senhor deu uma luz menor para levar homens e mulheres à luz maior”. Seus escritos são chamados de “luz menor”, não por causa do grau de inspiração, mas por conta de sua função e autoridade. O propósito de seus escritos é nos conduzir à Bíblia e auxiliar no processo de compreensão. As Escrituras, por sua vez, são a luz maior, cuja função é nos levar a Cristo e à salvação (Jo 5:39).

PRINCÍPIO ORGANIZADOR

Examinando os escritos de Ellen White percebe-se que neles o grande conflito é um tema predominante. Mais do que isso, é também seu princípio organizador, “o conceito central que traz coerência a todos os assuntos bíblicos” (Herbert E. Douglass, “The Great Controversy theme: What it means to Adventists”, Ministry, dez/2000, p. 5). “Esse ‘grande pensamento central’ fornece unidade, coerência, transcendência e relevância duradoura para todas as informações encontradas em todos os livros da Bíblia. Cada mensagem bíblica, onde quer que seja encontrada, quando conectada ao ‘grande pensamento central’ da Bíblia, assume um ‘novo significado’” (Douglass, p. 6).

Assim, o tema do grande conflito nos permite ver harmonia entre assuntos que parecem conflitantes para outros cristãos, entre eles:

1. A relação entre a obra de Cristo na cruz e a obra do Espírito Santo na vida dos crentes;

2. A relação entre a lei e o evangelho;

3. A relação entre Cristo como Redentor e Governante.

4. A relação entre a obra de Deus e a obra humana no processo de salvação;

5. A relação entre justificação e santificação;

6. A relação entre o papel de Cristo como Sacrifício/Salvador e como Sumo Sacerdote/Mediador;

7. A relação entre o novo nascimento e a obediência à lei de Deus; e

8. A relação entre a fé e a obediência e as boas obras (Douglass, p. 7).

É devido a essa revelação do grande conflito que a escatologia adventista é peculiar. Ela considera um conjunto de ideias que, seguindo esse princípio organizador, interagem entre si e incluem “a imortalidade condicional, a guarda do sábado, a interpretação historicista pré-milenialista, a aceitação do dom profético manifestado no ministério de Ellen White, os ensinos sobre a obra sacerdotal de Cristo no santuário celestial e um povo preparado por Sua graça” (ibid.).

O tema do grande conflito revela como Deus trata com o pecado e o mal. Se o Senhor tivesse destruído Satanás no Céu assim que ele pecou, ninguém ficaria sabendo das consequências terríveis que o pecado acarreta e, em qualquer parte do Universo, poderiam surgir rebeliões contra Deus e Sua lei. Então, em lugar de extirpar o mal logo que ele despontou, o Senhor permitiu que ele se manifestasse por um tempo suficientemente longo a fim de que todos os seres inteligentes pudessem ver os resultados nefastos de sua escolha.

Infelizmente, a maioria das denominações cristãs adotou a ideia dos filósofos gregos pagãos de que a alma é imortal. Isso significa que os demônios e os ímpios arderão nas chamas do lago de fogo por toda a eternidade. Enquanto sofrerem, continuarão a pecar ao amaldiçoar a Deus. Dessa maneira, o pecado, o mal e o sofrimento nunca terão fim, e o Universo nunca será restaurado à sua perfeição original.

Nesse sentido, a visão dos adventistas do sétimo dia é bem diferente. O tema do grande conflito aponta para o fim do pecado e do mal em todas as suas formas. Satanás, seus anjos e todos aqueles que recusaram a salvação que lhes foi oferecida serão destruídos e deixarão de existir. O problema do pecado será solucionado, e todos os seres inteligentes do Universo terão a plena convicção de que transgredir a lei divina não compensa. Os salvos saberão disso por experiência própria, e anjos e habitantes de outros mundos porque observaram por muito tempo o que aconteceu com os habitantes da Terra. O apóstolo Paulo afirmou que somos o palco do Universo (1Co 4:9). A história da redenção garantirá que o pecado nunca mais se levante novamente.

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As revelações sobre o grande conflito escritas por Ellen White e que se relacionam com os eventos finais são claras e, por vezes, precisas. Embora não saibamos as datas desses eventos, podemos relacionar uns com os outros e descobrir a sequência em que ocorrerão. Um modo de se fazer isso é usar o fechamento da porta da graça como eixo. Sendo assim, antes desse acontecimento virá a chuva serôdia sobre o povo de Deus (Ellen G. White, O Grande Conflito [CPB, 2021], p. 508); o evangelho será pregado a todo o mundo (ibid.); as três mensagens angélicas serão anunciadas (p. 510); haverá a união das igrejas com base em pontos comuns, o que incluirá católicos, protestantes e espíritas (p. 490); ocorrerá o decreto dominical (p. 503); será formada a imagem da besta, ou seja, as igrejas pressionarão os governos para obrigar os dissidentes a se adequarem à maioria quanto às práticas religiosas (p. 372-378; 503, 504); e ocorrerá o processo em que os salvos serão selados por Deus e os ímpios receberão a marca da besta (p. 504).

Quando a porta da graça se fechar, o juízo investigativo terá fim (p. 410, 411), Cristo deixará de interceder e sairá do santuário celestial (p. 510). Como consequência, o Espírito Santo será retirado definitivamente dos ímpios (p. 505, 506, 510). Então, todos os casos estarão decididos para a vida eterna ou para a destruição definitiva (p. 510).

Após esse evento, haverá uma grande angústia final, resultado da soltura dos quatro ventos, que simboliza a liberdade das forças satânicas para ter completo domínio sobre os ímpios, uma vez que Deus retirará Sua proteção e deixará que sigam o caminho que escolheram (p. 491, 510, 511). Um decreto de morte será assinado contra os observadores do sábado (p. 511, 512, 523, 527); virá um tempo de angústia para o povo de Deus (p. 512-518); Satanás personificará a Cristo (p. 518, 519); as sete pragas serão derramadas (p. 520-522); e Jesus voltará (p. 531-540)!

CONCLUSÃO

Ellen White afirmou em seu livro que o propósito da obra era “ressaltar fatos e princípios que têm relação com os acontecimentos futuros. […] Encarados como uma parte do conflito entre as forças da luz e das trevas, todos esses relatos do passado se revestem de um novo significado; e por meio deles, projeta-se uma luz no futuro, iluminando o caminho daqueles que, assim como os reformadores dos séculos passados, serão chamados a testificar da Palavra de Deus” (p. 11).

“Esta obra tem como propósito: desdobrar as cenas do grande conflito entre a verdade e o erro; revelar as ciladas de Satanás e os meios pelos quais podemos resistir a ele de forma eficaz; apresentar uma solução satisfatória para o grande problema do mal […] e mostrar a natureza santa e imutável de Sua lei” (p. 11, 12).

A autora expressou seu desejo em relação à leitura de O Grande Conflito dizendo: “Que por meio de sua influência muitos possam se libertar do poder das trevas e se tornar participantes ‘da herança dos santos na luz’ (Cl 1:12)” (p. 11). É por acreditar nessas palavras que a Igreja Adventista está investindo na publicação e distribuição desse livro aos milhões, e todos somos convidados a participar dessa missão.

Estamos em meio ao grande conflito. Conhecemos os principais eventos que estão para ocorrer. Sabemos qual será o resultado. Em que exército você se alistou? Escolha lutar ao lado de Cristo e convide outros para que eles também sejam vitoriosos!

EMILSON DOS REIS é professor emérito da Faculdade de Teologia do Unasp, campus Engenheiro Coelho (SP)

(Artigo publicado na Revista Adventista de setembro/2023)

Última atualização em 3 de setembro de 2023 por Márcio Tonetti.