A mulher que abriu caminho para que outras encontrassem seu papel na igreja
Thiago Basílio
A máxima de que Deus tem um propósito na vida de cada um dos seus filhos nunca se torna clichê. Sua lógica é real e absolutamente constatável na história de muitas pessoas. Mesmo que, em momentos isolados, isso não se mostre tão evidente, quando observamos todo o enredo, constatamos que as peças foram se articulando divinamente em um propósito sublime.
Isso foi muito visível na trajetória de Meibel Mello Guedes. Criada em um sítio no interior do Rio Grande do Sul, ela e seus dez irmãos viviam confortavelmente das empresas de seu pai, Odilon Pereira Mello. Sua mãe, Lyli Fortes Mello, mulher dedicada e socialmente consciente, era professora dos próprios filhos e das crianças dos funcionários da propriedade rural. Tudo com as devidas autorizações legais dos órgãos públicos. Tanto o pai quanto a mãe eram fiéis a Deus e comprometidos com Sua missão, destinando recursos para a construção de igrejas e a pregação do evangelho em regiões ainda não alcançadas.
Essas referências serviram como fonte de inspiração para Meibel, que, infelizmente, teve de enfrentar ainda muito cedo situações extremamente difíceis. Aos sete anos, ela perdeu o pai, vítima de Acidente Vascular Cerebral (AVC). A mãe passou a administrar os negócios e todas as outras demandas familiares. Com o passar do tempo, Lyli concluiu que as oportunidades de estudos para os filhos naquela localidade eram muito limitadas. Então, ela decidiu alugar todas as empresas e ir com os filhos para a cidade de Palmeira das Missões.
Mudanças necessárias
A mudança de endereço abriu novos horizontes para a educação dos filhos, mas a existência de aulas aos sábados trouxe problemas. Ao completar 13 anos, Meibel decidiu que iria para o Instituto Adventista Cruzeiro do Sul (Iacs), internato localizado no município de Taquara, a cerca de 80 quilômetros de Porto Alegre. Na nova escola, ela passou momentos marcantes e inesquecíveis. Sempre esteve envolvida nas atividades religiosas, acadêmicas e sociais. Aquele ambiente lhe proporcionou um lar.
Ali ela conheceu Arlindo Guedes, com quem iniciou um namoro. Mais tarde, ele cursaria Teologia no Instituto Adventista de Ensino, atual Unasp, campus São Paulo, e ela, Educação Física, em Porto Alegre. Em 12 de fevereiro de 1974, casaram-se. Pouco tempo depois, tiveram a grata surpresa de receber o convite para servir a igreja em Palmeira das Missões, cidade em que Meibel morou na infância e parte da adolescência. Nesse contexto, começaram, então, uma parceria que, posteriormente, alçaria Meibel numa posição vanguardista de ressignificação do papel da mulher na igreja.
Após um período de três anos nesse distrito pastoral, em que Meibel criou uma aproximação mais intensa com a membresia feminina através do trabalho com o Ministério da Criança, o casal foi transferido para Novo Hamburgo, na região metropolitana de Porto Alegre. Nesse meio tempo, Meibel descobriu que estava grávida e teria sua primeira filha.
Pouco tempo depois, seu esposo foi ordenado ao ministério e, junto com essa importante etapa na vida de um pastor, veio também um convite para que assumisse o cargo de ministerial e evangelista da Associação Sul-rio-grandense (ASR), uma das sedes da igreja no Estado.
Ao questionar o marido sobre suas novas atribuições, foi informada de que, na prática, ele seria responsável por “cuidar dos pastores” (função que, no contexto adventista, recebe o nome de Ministerial). Prontamente, Meibel propôs que os dois poderiam adicionar um novo objetivo ao trabalho, tendo em vista que as esposas dos pastores também precisavam de auxílio.
Arlindo se empolgou com a proposta e, cinco meses depois, em junho de 1979, apoiou a implantação da Associação Ministerial Área Feminina (Amaf). Meibel foi escolhida para coordenar a iniciativa. À frente do grupo por vários anos, ela promoveu, por exemplo, o primeiro concílio de esposas de pastores no Brasil, entre outras iniciativas, como ministração de cursos e projetos sociais e na área da saúde.
Alguns anos mais tarde, depois que ela havia recebido uma carta da sede mundial adventista que solicitava informações sobre a forma com que o grupo se organizava para desenvolver esse ministério em favor das esposas dos pastores, a igreja na América do Sul reconheceu oficialmente a iniciativa, que passou a se chamar Ala Feminina da Associação Ministerial (Afam).
Ministério da Mulher
Depois de coordenar o Ministério da Criança numa das sedes administrativas da igreja em São Paulo, Meibel foi chamada para liderar a Afam na sede estadual adventista, a União Central Brasileira. Ali, ela buscou ampliar seus projetos e promoveu o primeiro concílio da Afam na região, recebendo uma participação expressiva de mulheres e bons palestrantes, inclusive internacionais, vindos dos Estados Unidos.
Com a expansão das atividades, cada vez mais o trabalho despertou a atenção da liderança da igreja nos seus vários níveis administrativos, o que resultou na criação do Ministério da Mulher, em 1994. Na União Central Brasileira, Meibel foi escolhida para assumir a direção do novo departamento, mas sob condições ainda muito limitadas. O campo esclareceu que, inicialmente, o ministério não teria verba e disponibilidade de tempo para o exercício adequado da função. Além disso, havia certa resistência quanto à atuação da mulher em funções como essa.
Mesmo tendo resistido inicialmente para assumir o cargo, ela aceitou o desafio. Na época, a sede administrativa da igreja no continente não tinha diretrizes claras para essa área. Então, ela buscou informações no documento oficial da Associação Geral sobre o departamento. Meibel também passou a acompanhar o trabalho das mulheres em outras partes do mundo. Paralelamente, criou mecanismos para angariar fundos a fim de promover ações como retiros espirituais. A primeira edição de um evento desse tipo reuniu 250 participantes; a segunda, 1,5 mil; e a terceira, quase 2 mil. Ainda foram desenvolvidos vários projetos de impacto na vida da igreja, da mulher, da saúde e da comunidade regional, como, por exemplo, a campanha Quebrando o Silêncio, voltada para o combate da violência doméstica. “Deus nos abençoou ricamente porque esse ministério veio para ficar e para se unir à liderança da igreja na tarefa de semear o plano da Salvação. Hoje ele conta com um exército de mulheres comprometidas com os ideais cristãos, levando avante esse ministério de amor”, destaca.
Apesar de estar aposentada, aos 65 anos Meibel continua envolvida nesse ministério. Através dos livros que publicou no Brasil e no exterior e das palestras que têm sido convidada a realizar em vários lugares, ela tem encorajado as mulheres a ser porta-vozes do reino eterno em seus respectivos contextos.
Força, tenacidade, propósito e fé são aspectos que se destacam na biografia dessa gaúcha escolhida por Deus para ajudar outras a encontrar seu papel na igreja.
THIAGO BASÍLIO é jornalista e atua como professor no curso de Comunicação Social do Unasp, campus Engenheiro Coelho (SP)
Última atualização em 26 de março de 2018 por Márcio Tonetti.