ADRA Brasil adaptou 16 de seus projetos sociais para atender os mais vulneráveis à pandemia
Luciana Santana
A beleza natural dos rios caudalosos e a riqueza da mata amazônica contrastam com a realidade social e econômica das famílias mais vulneráveis da Amazônia. Manaus, a capital amazonense, por exemplo, está entre as metrópoles brasileiras mais afetadas pela pandemia. É nessa cidade que mora a faxineira Maria Reidiene da Silva, às margens do lago do Puraquequara, afluente do rio Amazonas. Ela divide uma casa de dois cômodos com o esposo, o pedreiro Saul Mota, e mais seis filhos. Há dois meses sem trabalho por conta do distanciamento social, o casal de autônomos tem enfrentado dificuldade até para se alimentar.
Mais ao sul do país, na capital paulista, cidade conhecida por receber imigrantes de todo o mundo, e hoje epicentro da pandemia no Brasil, é que vive a advogada Sylvie Mutiene e seus dois filhos. Em 2013, eles deixaram a República Democrática do Congo, sua terra natal, por causa de conflitos políticos. Em São Paulo, Mutiene divide o mesmo teto com nove familiares. Antes da crise do novo coronavírus, ela trabalhava como autônoma no ramo de alimentação, mas a quarentena reduziu quase em 100% sua demanda de trabalho.
Ainda que separadas por quase 4 mil quilômetros, a realidade que une Maria Reidiene e Sylvie Mutiene é a dos impactos socieconômicos de uma grande crise sanitária. Ambas também estão sendo ajudadas pela ADRA, Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais. No Brasil, nos últimos meses, a agência humanitária da Igreja Adventista tem adapatado 16 de seus projetos para socorrer cerca de 111 mil pessoas em condições de vulnerabilidade social.
Uma dessas ações mais emergenciais é o combate à fome, por meio da doação de cestas básicas e de cartões de alimentação. A família de Maria Reidiene é uma das 750 beneficiadas pela ADRA em Manaus. “Esse cartão de alimentação veio na hora certa! Agora, pelo menos a nossa alimentação estará garantida durante três meses. Irei ao mercado escolher e comprar o que estamos precisando em casa”, agradece.
De acordo com o diretor da ADRA Brasil, pastor Fábio Salles, a ONG tem priorizado seus projetos emergenciais, por mais que não tenha deixado de atuar com ações de desenvolvimento, outra área importante do trabalho da entidade. “Neste momento de crise, estamos atuando junto à população mais vulnerável do país por meio de ações emergenciais e de geração de renda (cursos profissionalizantes on-line), com vistas ao período pós-pandemia. Porém, a assistência alimentar tem sido hoje nosso carro-chefe”, explica Salles. Segundo ele, a agência já distribuiu 15.756 cestas básicas e 5.252 cartões de alimentação, garantindo assim a esses beneficiários a dignidade de voltar ao supermercado e poder escolher a própria comida.
ASSISTÊNCIA E GERAÇÃO DE RENDA
Do mesmo modo que Maria Reidiene, Sylvie Mutiene tem sido apoiada pela ADRA Brasil. “Temos recebido muito apoio com cestas básicas e até gás de cozinha do projeto Base Gênesis. Conseguir estabilidade no país que não é o nosso é muito difícil, principalmente agora, com a pandemia. Então, essa ajuda com alimentos tem nos mantido”, reconhece a advogada congolesa.
Mutiene faz referência ao centro de influência adventista Instituto Base Gênesis, que mais recentemente passou a atuar sob o guarda-chuva da ADRA Brasil. Criado há cinco anos no marco zero da capital paulista, a Praça da Sé, o espaço é voltado para oferecer acolhimento psicossocial, atendimento jurídico e cursos de geração de renda, especialmente para refugiados. A entidade atende hoje pessoas de 23 nacionalidades e, desde o início da pandemia, tem auxiliado mais de 1,8 mil famílias.
Na Base Gênesis já eram oferecidas oficinas de costura para refugiadas. Porém, agora na quarentena e tomando os devidos cuidados, a produção tem sido direcionada para a confecção de máscaras. Mais de 6 mil unidades foram produzidas e vendidas ao Hospital Sírio-Libanês. A colombiana Esther Gonzalez, de 61 anos, é uma das beneficiadas por essa iniciativa. Até o ano passado, ela trabalhava como microempresária em sua cidade natal, na fronteira da Colômbia com a Venezuela, quando teve que deixar a região por causa da crise econômica e a instabilidade política.
Desde que chegou a São Paulo, Esther já fez o curso de português ministrado na Base Gênesis, recebeu cestas básicas e tem trabalhado também no projeto de geração de renda na área de costura. “O projeto ‘Costurando Vidas’ mudou minha vida e a de muitas pessoas. E agora, na pandemia, tenho o prazer de ensinar essa técnica para outros. A confecção de máscaras e aventais tem nos ajudado a conseguir uma renda nesse tempo de isolamento social. E já estamos pensando em montar um negócio mais para frente. Sou muito grata pelo apoio, respeito e carinho que temos recebido aqui”, testemunha Esther, que desde os 13 anos de idade costura, pois aprendeu o ofício com sua mãe.
HIGIENIZAÇÃO E PARCERIAS
Em Roraima, a atuação da ADRA tem sido importante também na conscientização da população quanto à prevenção da Covid-19. Na capital Boa Vista, por exemplo, o projeto Wash (do verbo em inglês “lavar”) tem alcançado brasileiros e refugiados venezuelanos. “Nos últimos dois meses, diariamente, 4,5 mil pessoas são instruídas a lavar as mãos do jeito certo. Nós montamos 15 pontos de higienização próximos aos abrigos e à rodoviária da cidade”, relata o pastor Arlindo Kefler, diretor regional da agência.
Outra ação que viabiliza a higienização, especialmente da população em situação de rua, é a carreta da ADRA Brasil. A unidade móvel percorre diversas regiões do país para oferecer apoio em parceria com as prefeituras locais. Em Rio Grande (RS), por exemplo, o caminhão da agência permaneceu no município por 15 dias, oferecendo diariamente 3 mil refeições e a lavagem de 350 quilos de roupa. “Fomos assistidos com carinho e eficiência. Muitos moradores de rua tiveram suas roupas lavadas. Neste momento, manter a higiene é mais do que nunca uma questão de saúde pública. Além disso, fomos ajudados com o almoço e o jantar todos os dias”, informa Aline Rodrigues, líder comunitária de um bairro atendido pela ADRA.
Por sua vez, em Salvador, capital baiana, a agência humanitária da igreja tem trabalhado em parceria com a prefeitura local para garantir a segurança física de 160 moradores em situação de rua da região da cidade baixa. Um hotel foi alugado e se tornou abrigo para gente como Paulo César Lima, de 45 anos. Por causa dessa iniciativa, há dois meses, ele tem onde tomar banho, se alimentar, lavar as roupas e dormir. “Me sinto seguro aqui, principalmente agora no inverno com as chuvas. Assim estamos nos protegendo da Covid-19 e evitando mais contaminação”, relata Paulo César.
Até o fim de maio, a ADRA havia ajudado mais de 280 mil pessoas em oito países sul-americanos, por meio de 53 projetos de saúde, segurança alimentar, higiene e apoio psicossocial. No total, até agora, 2,3 milhões de dólares foram destinados para a resposta à crise. Para saber mais ou doar, acesse adra.org.br. Ao redor do mundo, o trabalho da agência tem beneficiado 501 mil pessoas em 71 países (ver adra.org).
ESTAMPE SUA CAUSA
LUCIANA SANTANA é jornalista freelancer
(Reportagem publicada originalmente na edição de junho de 2020 da Revista Adventista)
Última atualização em 17 de junho de 2020 por Márcio Tonetti.