Tempo de desconexão

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Aproveitando as férias sem distrações tecnológicas

Pablo Canalis

Foto: Adobe Firefly

Mariana terminou de arrumar a mala dos filhos Carlinhos, de 11 anos, e João, de oito. Enquanto isso, o esposo ajeitava parte da bagagem no porta-malas do carro. Seriam 600 km de estrada, e ele queria sair cedo para evitar o trânsito pesado. Fazia muito tempo que a família não ia àquele agradável hotel fazenda. O filho mais novo estava muito empolgado, pois suas lembranças das últimas férias que haviam passado naquele lugar eram as melhores possíveis. O mais velho, porém, achava que a viagem seria ruim, porque não haveria sinal de internet, e ele não poderia usar livremente o celular.

Há algum tempo, Carlinhos já não conversava direito com a família, pois gostava de ficar horas usando os aplicativos do smartphone. Quando Mariana reclamava com ele sobre isso, o garoto retrucava: “Se meu pai fica no celular o tempo todo, por que você reclama tanto comigo?” Diante do argumento, a mãe respondia que o pai usava o aparelho para resolver questões do trabalho, mas a justificativa não era tão convincente, e ela sabia disso.

Naquela noite, ao chegarem no quarto do hotel, Mariana fez uma proposta ao esposo: “Nestas férias, vamos tentar ficar longe do celular? Precisamos nos desconectar em algum momento. Eu sei que é difícil, porque sempre há algo para resolver, e as pessoas não querem saber se você está de férias ou não. Estabeleça um horário para ver as mensagens; mas, por favor, vamos tentar desligar os aparelhos.” O marido olhou para ela e concordou que aquilo era importante; então, foram dormir.

ESTAMOS PERDENDO O HÁBITO DE OLHAR NOS OLHOS, PRESTAR ATENÇÃO NAS PAISAGENS E APROVEITAR AS EXPERIÊNCIAS QUE VIVEMOS EM FAMÍLIA

Os primeiros dois dias daquela semana foram desafiadores. Deixar o celular de lado sempre provocava algum conflito, e houve momentos em que Mariana teve que controlar os ânimos de todos. Contudo, no terceiro dia sem celular, as coisas começaram a se acalmar. Carlinhos, que a princípio não estava animado com a viagem, passou a conversar mais com os pais e a brincar com o irmão. De repente, as barreiras de comunicação familiar pareciam ter sido removidas, e todos começaram a aproveitar melhor o passeio. No quinto dia, Carlinhos disse ao pai: “Fazia muito tempo que eu não tinha a sensação de que o tempo estava passando devagar. Parece que o dia não termina nunca. Estou gostando disso!”

Nas minhas férias em família, adoto uma prática que tem me ajudado bastante. Tenho o costume de deixar o celular no cofre do quarto do hotel, ligando-o apenas à noite para avisar a família de que estamos bem. Minha esposa é quem tira as fotos da viagem; mas, em alguns dias, até o celular dela vai para o cofre. Sentimos a diferença cada vez que colocamos isso em prática, e também percebemos o quanto o celular nos consome quando, por algum motivo, não o deixamos no cofre.

Estamos perdendo o hábito de olhar nos olhos, prestar atenção nas paisagens e aproveitar as experiências que vivemos em família. O tempo passa a um ritmo muito diferente quando nossa mente está presa ao celular, e a indústria sabe o quanto isso nos absorve. As férias voam, e nossa mente não desfruta o momento nem descansa realmente. Estar sem o smartphone vai nos ajudar a focalizar aquilo que é mais importante: conectar-nos com nossa família de maneira especial e, inclusive, estreitar nossa comunhão com Deus.

Toda semana temos um “dia de férias” que Deus nos deu de presente para que possamos crescer em nosso relacionamento com ele, com nossa família e com as pessoas ao redor. O desafio de deixar o celular é semanal. Será que vamos conseguir superá-lo? 

PABLO CANALIS é médico especialista em Psiquiatria, pós-graduado em Medicina da Família e Comunidade

(Artigo publicado na seção Em Família da Revista Adventista de julho/2024)

Última atualização em 22 de julho de 2024 por Márcio Tonetti.