Aroma de perdão

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O amor verdadeiro se revela nos momentos em que tudo parece dar errado

Pablo Canalis

Imagem generativa: Renan Martin

Guilherme chegou mais cedo naquela tarde, mas bastante cansado. O dia, para Maria Júlia, sua esposa, também não havia sido fácil. Ao entrar em casa, ele desejava se sentar no sofá por alguns minutos para recuperar as forças. Trabalhar em uma transportadora era cansativo, mas o expediente de sexta-feira exigia ainda mais, porque o chefe lhe concedia os sábados de folga. Por isso, ele precisava atender a mais pedidos pela manhã, a fim de compensar o dia em que não trabalharia e conseguir sair antes do pôr do sol. Enquanto descansava na poltrona, ouviu a esposa dizer:

“Amor! Poderia me ajudar? Preciso que você olhe o bolo para mim. Vou buscar alguns ingredientes que faltam para o almoço de amanhã e já volto. Por favor, se puder, também tire a roupa do varal. Acho que já está seca.”

Disposto a ajudar, Guilherme perguntou à esposa quanto tempo de cozimento seria necessário para o bolo ficar pronto. Em sua avaliação, durante a espera, achou que conseguiria ver algumas mensagens no celular antes de tirar a roupa do varal. Contudo, ele perdeu a noção do tempo e, por fim, não tirou a roupa do varal nem prestou atenção ao bolo.

A história tornou-se trágica quando a filha do casal, de seis anos, notou o cheiro de queimado e perguntou ao pai o que estava acontecendo. Guilherme ficou desesperado. Abriu o forno, tirou o bolo, desligou o aparelho e correu para recolher as roupas do varal. Quando olhou para o quintal, percebeu que estava chovendo. O caos estava instalado!

Reconhecer os próprios erros é importante, mas transformar esse reconhecimento em atitudes concretas é o que realmente faz a diferença

Ele conseguiu recolher metade das roupas, mas a chuva estava se intensificando, molhando o restante. Parecia que tudo conspirava para agravar a situação.

Nesse momento, Maria Júlia chegou. Ao entrar em casa, sentiu o cheiro de queimado e começou a gritar: “Guilherme! Que cheiro é esse?”

A filha se adiantou e respondeu antes que o pai pudesse falar: “O papai queimou o bolo, mamãe. Ele estava mexendo no celular.”

Uma sequência de olhares fulminantes se sucedeu rapidamente: o pai olhou para a filha, a esposa olhou para o marido e até o cachorro percebeu o clima tenso e foi se esconder na casinha dele.

Imprevistos acontecem, alguns por distração, outros por ignorância e outros ainda por falta de planejamento. É verdade que, em certas ocasiões, tudo parece conspirar para o desastre, e muitas vezes não conseguimos lidar com esses momentos da melhor forma.

Naquela noite, durante o culto de pôr do sol, após um silêncio incômodo, Guilherme se aproximou da esposa e falou baixinho em seu ouvido: “Perdoe-me.” Sua atitude expressava compreensão do erro e arrependimento genuíno. Maria Júlia entendeu e aceitou o pedido de desculpas. Então, começaram a cantar um hino transmitido na televisão; a música ajudou a acalmar os ânimos, que já estavam melhores no momento da oração em família.

Reconhecer os próprios erros é importante, mas transformar esse reconhecimento em atitudes concretas é o que realmente faz a diferença. Mais do que palavras, são as ações que demonstram arrependimento e desejo sincero de mudança. Às vezes, será necessário silenciar o orgulho, assumir as consequências e dar passos firmes na direção da reconciliação. É assim que se constroem relações mais fortes e vitórias duradouras: com sinceridade, coragem e disposição para recomeçar. 

PABLO CANALIS é médico especialista em Psiquiatria, pós-graduado em Medicina da Família e Comunidade

(Artigo publicado na seção “Em Família” da Revista Adventista de agosto/2025)

Última atualização em 27 de agosto de 2025 por Márcio Tonetti.