Líquido ou sólido?

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O povo de Deus precisa resistir à tentação de se moldar aos padrões do mundo

Erton Köhler

Foto: Adobe Stock

A água é um elemento vital para a manutenção da vida, mas também uma grande fonte de ilustrações espirituais. Na Bíblia, ela é símbolo de várias coisas. No santuário, a água era purificadora (Êx 29:4; Nm 8:6, 7). Na igreja, a “lavagem de água pela Palavra” leva à santificação (Ef 5:25-27). Na conversão é necessário “nascer da água e do Espírito” (Jo 3:5). Mas a grande força de sua mensagem está em Deus, a “fonte de água viva” (Jr 2:13), que se revela por meio de Jesus (Jo 4:10) e que faz de Seus filhos “rios de água viva” (Jo 7:38) para compartilhar a salvação.

Em seu livro Desconforme-se (Thomas Nelson, 2017), Richarde Guerra usa a água como ilustração de nossa postura espiritual nestes dias tão desafiadores. Ele mostra que uma poça de água e um cubo de gelo são quimicamente iguais, mas na prática são diferentes. O estado líquido tem o que se chama de “forma variável”. Nele a água se molda ao recipiente onde é colocada. Pode ser um copo, uma fôrma, uma bacia ou qualquer outro objeto, ela se adapta imediatamente. O estado sólido, porém, tem uma “forma constante”. O cubo de gelo, dentro de um copo, bacia ou fôrma, terá exatamente o mesmo formato de cubo.

Isso nos ajuda a entender melhor a recomendação do apóstolo Paulo: “E não vivam conforme os padrões deste mundo” (Rm 12:2). Se ele fosse um químico, teria escrito: “Não sejam líquidos” ou “Não assumam a forma do recipiente em que vocês estão”. Seu convite é para que sejamos cubos de gelo que não se derretam diante dos desejos secularizados.

A sedução para nos moldarmos aos padrões do mundo é muito grande. Esses padrões aparecem na tela do celular, do computador ou da TV. Estão nos livros, revistas e vídeos. Manifestam-se nas casas, ruas e até mesmo em algumas de nossas igrejas, atraídas por uma visão secular. Nesse contexto, “a Bíblia passa a ser interpretada majoritariamente pela cultura, predomina a religião existencialista do aqui e agora, a missão se resume à assistência social, o pentecostalismo rapta o louvor e a adoração, os métodos são mais importantes que o conteúdo, santidade se torna legalismo e fé é confundida com sentimentalismo” (Vinícius Mendes, “Do Calvário ao Santuário”, Revista Adventista, abril de 2019, p. 15).

É fundamental retornar ao estado sólido que marcou o cristianismo em seu começo. Conforme ressaltou Ben Franks, o cristianismo nasceu desafiando a ordem social “em pelo menos três áreas amplas”: (1) “era uma religião distinta”, (2) “tinha uma ética distinta” e (3) “era uma cultura distinta” (bit.ly/3tGMNz4). Por mais atraente que uma “religião líquida” possa parecer, Ellen White alerta contra a tentação de “baixar ao nível do mundo” em nome da aceitação ou cumprimento da missão. Ela insiste: “Nas palavras, no vestuário, no espírito, em tudo, enfim, deve haver assinalada distinção” (Para Conhecê-Lo, p. 305).

Ser como água que se molda às necessidades do próximo leva esperança e compartilha o amor de Deus. Mas ser como o gelo significa manter a identidade e não negociar princípios. Para isso, precisamos mergulhar a mente na água transformadora da Palavra de Deus. Só ela é capaz de purificar nossas referências e nos tornar mais sólidos e mais consistentes.

ERTON KÖHLER é presidente da Igreja Adventista para a América do Sul

(Artigo publicado originalmente na seção Bússola da edição de março de 2021 da Revista Adventista)