As principais ações da Igreja Adventista que repercutiram no cenário nacional e internacional ao longo da semana
MÁRCIO TONETTI
“Estamos prevendo uma fome generalizada de proporções bíblicas”. A declaração feita nesta semana por David Beasley, diretor executivo do Programa Mundial de Alimentação (PMA), deixou o mundo em estado de alerta. Falando ao jornal inglês The Guardian sobre o impacto econômico da pandemia, o coordenador da agência de assistência alimentar da ONU disse que o número de pessoas que sofrem com a fome pode chegar a 265 milhões neste ano, o dobro da população afetada antes da crise provocada pelo novo coronavírus. Segundo Beasley, essa situação representaria uma “catástrofe humanitária”.
Como noticiou o site do The Guardian, o PMA já previa, com base em levantamentos feitos no ano passado, que 2020 seria o pior ano desde a Segunda Guerra Mundial. Porém, duas novas situações agravaram o cenário: a mais devastadora invasão de gafanhotos das últimas décadas na África Oriental, registrada no início deste ano, que colocou em risco 70 milhões de pessoas, e a crise provocada pela Covid-19. Levando em conta fatores como esses, a ONU entende que o problema não será agravado apenas pela falta de mantimentos, mas também pelo desabastecimento.
“Estamos prevendo uma fome generalizada de proporções bíblicas”
Apesar das projeções negativas, Beasley ressaltou que, “se conseguirmos dinheiro e mantivermos as cadeias de suprimentos abertas, poderemos evitar a fome” e as mortes que poderiam ocorrer como consequência da falta de alimento.
O combate a essa pandemia de inanição vai exigir mais doações, a colaboração de governos em não fechar fronteiras ou restringir o fornecimento de alimentos, e ações de curto e longo prazo. Essas projeções têm levado a igreja a pensar em formas de ajudar a minimizar o impacto da crise agora e no futuro. Nos Estados Unidos, onde a escassez de alimentos também se agravou com a chegada da Covid-19 ao país, um banco de alimentos adventista em Escanaba, no estado de Michigan, tem ajudado a suprir as necessidades de milhares de americanos que estão dependendo de doações para sobreviver. Por meio da iniciativa, foram disponibilizadas três unidades móveis para auxiliar no atendimento a pedidos emergenciais de alimentos. O projeto é um dos únicos da região que oferece esse tipo de serviço e a assistência tem se estendido, inclusive, para outros países.
A Feeding America, uma das maiores organizações de caridade de combate à fome no país e apoiadora do programa da igreja, estima que pelo menos 17,1 milhões de pessoas passarão a enfrentar insegurança alimentar nos próximos meses nos Estados Unidos, um aumento de 46%.
No Brasil, projetos da ADRA (Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais) também estão contribuindo para garantir o abastecimento durante a pandemia. Nesta semana, o portal oficial da igreja no país noticiou que, pelo menos sete estados, mais o Distrito Federal, já receberam ajuda.
No Amazonas, por exemplo, uma parceria com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) permitiu que a agência humanitária da igreja incrementasse o valor mensal doado às famílias de refugiados cadastradas pelo Centro de Apoio e Referência a Refugiados e Migrantes (CARE), dinheiro que tem sido usado para comprar comida. Além disso, segundo a Agência Adventista Sul-americana de Notícias (ASN), as famílias também têm sido monitoradas e orientadas sobre como prevenir a Covid-19.
Já em Brasília (DF) e Goiás, foram arrecadadas 7 mil cestas básicas, entregues a 6,5 mil famílias. Na Bahia, a unidade móvel da ADRA Brasil, utilizada na resposta a emergências, entregou mais de 10 mil marmitas e lavou 5 toneladas de roupas num bairro de Salvador (clique aqui para ver como está sendo o atendimento em outras regiões do país).
VEJA NA GALERIA ALGUMAS AÇÕES DA IGREJA
Diversas ações de arrecadação e distribuição de alimentos envolvendo voluntários da igreja também tem surgido mundo afora. No norte da Colômbia, por exemplo, agricultores doaram mais de 9 toneladas de mantimentos para cerca de 500 famílias entre os dias 4 e 14 de abril. A iniciativa contou com o apoio da ADRA no país (clique aqui para ler a reportagem na íntegra, em inglês).
Já na Austrália, o foco da assistência foi outro grupo. Em parceria com três chefs, jovens adventistas decidiram preparar refeições para quem está na linha de frente do combate ao coronavírus nos principais hospitais e centros de saúde de Melbourne, metrópole australiana. Os idealizadores do projeto chamado “Life.Box” fazem parte do programa The Mission Collective (O Coletivo das Missões, em tradução livre), que busca encontrar maneiras inovadoras e eficazes de praticar a missão.
Com propósito semelhante, líderes e membros da igreja no estado de Maryland (EUA) reuniram fundos, visando fornecer aproximadamente mil refeições para profissionais da saúde do Howard County General Hospital, que concentra grande número de pacientes com Covid-19.
DISTRIBUIÇÃO DE LIVROS
Numa época de quarentena, em que muitas pessoas estão redescobrindo a importância dos livros, ações de distribuição de literatura estão ajudando a levar esperança para as pessoas. Mas a igreja está tendo que encontrar maneiras alternativas de fazer isso. Uma ação criativa divulgada nesta semana repercutiu no site da Revista Adventista da Espanha, um dos países da Europa em que a procura por livros aumentou significativamente durante a pandemia. Lá, a igreja aproveitou o Dia Mundial do Livro (23 de abril) para lançar a campanha que vai distribuir gratuitamente exemplares do livro O Grande Conflito a quem se interessar pelo clássico da escritora americana Ellen White (clique aqui para ler a reportagem). Para receber em casa o material, basta preencher um formulário na internet.
No Brasil, a grande mobilização do projeto Impacto Esperança, que costuma ocorrer no fim de maio, foi adiada para 25 de julho (saiba mais aqui). Enquanto a distribuição corporativa não é possível, individualmente os membros estão aproveitando as oportunidades de compartilhar literatura, mas de maneira segura. Em Santa Catarina, por exemplo, além de máscaras doadas para as pessoas em supermercados da região, os voluntários distribuíram exemplares do livro A Maior Esperança, o mesmo que tem sido entregue junto com kits de higiene e cestas básicas em outros lugares.
APOIO À CIÊNCIA
Enquanto alguns têm procurado responder aos reflexos da atual pandemia, suprindo necessidades físicas e espirituais, outros estão apoiando a busca por soluções para a causa da crise na saúde pública. Segundo noticiou o site da Adventist Review, o AMITA Health, hospital adventista norte-americano localizado na região de Chicago, “está se unindo à luta nacional contra a Covid-19” por meio da coleta e fornecimento do chamado “plasma convalescente”. Testes clínicos feitos com base nessa técnica, que usa o sangue de pacientes curados da Covid-19 para tratamento experimental de pessoas infectadas pelo vírus, têm sido objeto de vários estudos, ainda inconclusivos, mas com “algum grau de confiança”, segundo avaliou o hematolologista Dante Langhi, presidente da Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH) numa entrevista recente à revista Saúde é Vital, da editora Abril.
Ainda no campo da pesquisa, a Universidade de Loma Linda (EUA) divulgou resultados de dois estudos realizados nos últimos oito anos no Laos e Camboja, países do sudeste asiático. Ambas as pesquisas comprovaram que fumantes têm não apenas maior risco de contrair doenças contagiosas, mas também de transmiti-las. Uma das explicações é que o compartilhamento de objetos utilizados por fumantes para alimentar o vício favorece a transmissão dessas doenças. Além disso, os pesquisadores concluíram que fumar compromete a função mucociliar, um dos principais mecanismos de defesa do trato respiratório.
Os dois estudos adventistas vão na contramão da hipótese levantada pelos autores de um polêmico estudo francês publicado nesta semana, o qual sugeriu que a nicotina, principal ativo do tabaco, poderia proteger contra a Covid-19. Para o doutor Pramil Singh, coordenador da equipe que investigou a população asiática e diretor do Programa Transdisciplinar de Pesquisa sobre Tabaco do Centro de Câncer da Universidade de Loma Linda, as descobertas feitas numa região em que se fuma muito podem ser fundamentais para entender o impacto negativo do tabagismo tanto na propagação quanto nas complicações geradas pela Covid-19. “Compreender essa correlação pode ajudar no combate ao tabagismo e na formulação de medidas preventivas para retardar a propagação do mortal novo coronavírus”, ele enfatizou, observando que aumentar o número de programas de combate ao fumo ajudaria a salvar muitas vidas e a achatar a curva da pandemia.
NOVAS FORMAS DE SERVIR
Seja no campo da pesquisa ou da ajuda humanitária, a igreja está buscando novas formas de ser relevante em meio à crise global. Serviços que antes não eram oferecidos, agora estão à disposição das pessoas, conforme divulgou o site da Escola de Saúde a Universidade de Loma Linda (EUA), que se uniu à Universidade de Redlands para oferecer cuidados médicos à população em situação de rua.
“O confinamento obriga as comunidades religiosas a se desconfigurarem, a fim de serem audíveis e compreensíveis para seus membros e a sociedade como um todo”
A percepção da socióloga Fabrice Desplan, membro do Centro Nacional de Pesquisa Científica da França (CNRS), é que “o confinamento obriga as comunidades religiosas a se desconfigurarem, a fim de serem audíveis e compreensíveis para seus membros e a sociedade como um todo”. Um exercício que, na visão dela, está sendo bem sucedido. A pesquisadora francesa disse isso depois de ter contato com a edição especial da Revue Adventiste de Théologie – Servir, revista da Faculdade de Teologia da Collonges-sous-Salève disponibilizada gratuitamente na internet, a fim de proporcionar uma visão mais ampla da pandemia (a edição em francês, intitulada “O coronavírus à prova da teologia e a teologia à prova do coronavírus”, pode ser acessada aqui).
Mas ao mesmo tempo que muitos tentam encontrar meios relevantes de ajudar quem precisa, outros têm se perguntado se é hora de deixar as cidades. No último fim de semana, líderes da Divisão Euroasiática chegaram a publicar uma declaração oficial sobre isso. Como foi explicado no documento, algumas pessoas têm usado textos de Ellen White fora do contexto para justificar a fuga para lugares afastados dos grandes centros. No entanto, a liderança da igreja entende que é o momento de a igreja, com todo o cuidado que a situação exige, suprir as necessidades físicas e espirituais daqueles que vivem nos locais mais afetados pela pandemia.
MÁRCIO TONETTI é editor associado da Revista Adventista (com informações da Lake Union Herald; epocanegocios.globo.com; noticias.adventistas.org; revista.adventista.es; adventistreview.com; adventistemagazine.com; Inter-American Division News; e North American Division News)
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Última atualização em 28 de maio de 2020 por wesley marco.