Pastor e escritor espanhol fala de como podemos ajudar as pessoas a lidar com a face mais cruel da pandemia
Márcio Tonetti
De uma comunidade rural no município de Sagunto, região de Valência, o pastor aposentado Roberto Badenas acompanhou as notícias do impacto devastador da pandemia em algumas regiões da Europa, especialmente em sua terra natal, cenário de muitas imagens que comoveram o mundo. Apesar de estar no grupo de risco e viver num dos países mais afetados pela Covid-19, ele não foi atingido pela doença, mas viu os efeitos dela chegarem bem perto. Nesta entrevista concedida por e-mail, ele fala sobre a reação da igreja à crise na Europa, a importância do ministério do consolo e a busca por significado na região como oportunidades para dar vida novamente à religião institucional no Velho Mundo.
Que leitura o senhor faz do cenário da pandemia?
O que a crise do novo coronavírus deixou claro é onde nossas sociedades têm suas prioridades. Quando comparamos a imensa quantidade de dinheiro que alguns países gastam em armas, preparando-se para destruir a vida de outros seres humanos considerados potencialmente inimigos, com a quantidade insignificante que eles dedicaram até agora para proteger a vida de seus cidadãos em emergências como essa, não temos dúvida de que a solidariedade humana é limitada.
De que maneira a igreja no Velho Mundo reagiu ao impacto da Covid-19?
Como esperado, a igreja respondeu com muito apoio e compaixão, estabelecendo um exemplo de comportamento cívico em muitos casos. Esse é o grande testemunho que se espera dos cristãos nessas circunstâncias.
É natural que, em um evento dessa magnitude e alcance, a interpretação dos sinais do fim esteja no centro do interesse da igreja e domine nossas reflexões teológicas. Mas este é igualmente um momento oportuno para compartilharmos a visão bíblica sobre a morte, com toda a sensibilidade que o tema e o momento exigem?
Na face mais sombria da realidade, nosso dever é fazer todo o possível para que o muro da morte não se torne para algumas pessoas sua única expectativa. O efeito colateral positivo mais imediato do sofrimento é a capacidade que ele nos dá de entender a dor dos outros. Nossa sensibilidade à dor deve reforçar nossa fé no valor sagrado do ser humano (Jo 3:16) e nos ajudar a compartilhar o plano misterioso de Deus de reconstruir vidas, mesmo as mais brutalmente destruídas.
Como consolar famílias que tiveram que lidar com a dor de um luto sem despedida?
Essa é uma das piores tragédias dessa pandemia. Não há dor pior do que aquela que é sofrida em completa solidão. A assistência, especialmente se for acompanhada pela luz da esperança em outra vida, pode tornar suportável até a mais dolorosa despedida. É possível enfrentar tudo quando se tem a certeza de ser totalmente compreendido e amado por Deus, e que os sofrimentos atuais são temporários. Esse é o momento de mostrarmos solidariedade e compartilhar nossa mensagem.
A pandemia já tem levado as pessoas a se reaproximarem da religião institucional no contexto secular europeu?
Nessas provações extremas há uma necessidade vital de encontrar a paz da alma, e isso é experimentado por pessoas secularizadas tanto ou mais que qualquer outra pessoa. Ajudemos aqueles que ainda debatem nas trevas da dúvida a manter abertas as janelas da alma à luz da fé.
O senhor vislumbra algum tipo de mudança no adventismo europeu pós-pandemia?
Ainda é cedo para responder. Não sabemos que direção os eventos podem tomar nesta Europa complexa e secularizada. Mas não tenho dúvidas de que este momento é uma oportunidade de ouro para nós, crentes, individualmente e como membros da igreja, nos perguntarmos sobre nossas prioridades e nossa missão neste mundo.
(Entrevista publicada originalmente na edição de junho de 2020 da Revista Adventista)
Última atualização em 8 de junho de 2020 por Márcio Tonetti.