Em momentos críticos, a sensação de que Deus está longe pode se acentuar
Marcos De Benedicto
Era um dia qualquer em New Salem, uma vila perdida em Illinois, na estrada de Springfield para Havana. Ano: 1832. Com ansiedade no olhar, William perguntou para seu sócio em um pequeno armazém: “Por quanto tempo mais conseguiremos aguentar?” Com ar de resignação, o desajeitado Abraham, 23 anos, rosto anguloso, respondeu do alto de seu 1,93 metro de altura: “Pois é, parece que nosso negócio está quase fechando.” E prosseguiu: “Sabe, eu não me importaria, desde que pudesse realizar meu sonho. Quero estudar Direito. Se eu pudesse vender tudo, pagar as dívidas e ficar com o suficiente para comprar os comentários de Blackstone sobre a lei inglesa, tudo bem para mim. Mas acho que não posso.”
Naquele momento, uma carroça de aparência estranha vinha subindo a estrada. O carroceiro parou perto da varanda da loja, olhou para Abraham e disse: “Estou tentando levar minha família para o Oeste, mas o dinheiro acabou. Tenho um bom barril aqui que poderia vender por 50 centavos…” Os olhos do jovem comerciante percorreram a carroça e se dirigiram à mulher do viajante, a qual o olhava suplicantemente, o rosto macilento. Abraham enfiou a mão no bolso e tirou uma moeda, os últimos 50 centavos que tinha. O dia inteiro o barril ficou num canto do armazém. Mais tarde, Abraham resolveu ver o que havia nele. Esticando os longos braços, tocou algo sólido. Tirou um livro e ficou petrificado: era o comentário de William Blackstone sobre a lei inglesa (em geral, publicado em quatro volumes).
Mais tarde, Abraham Lincoln (1809-1865) relembraria aquele momento com emoção: “Fiquei lá segurando o livro e olhando para o céu. Tive uma profunda impressão de que Deus tinha algo especial para eu fazer e de que Ele estava me mostrando que eu devia me preparar para isso.”
Essa é uma versão romantizada e popularizada por pregadores. Porém, no livro The Life of Abraham Lincoln (A. L. Burt, 1901, p. 66-67), Henry Ketcham registrou uma confirmação do próprio Lincoln de que ele comprou um velho barril de um migrante e achou a obra dentro dele. Portanto, há boa chance de que a história seja verdadeira. O fato é que o senso de que a providência divina estava guiando sua vida foi fundamental para que Lincoln se tornasse o 16º presidente dos Estados Unidos, vencesse a Guerra Civil, colocasse fim à escravidão no país, unificasse a nação e deixasse um legado de liberdade.
O secularismo tentou banir a providência do universo filosófico e cotidiano, mas saiba que você não está sozinho
Providência. Qual é a sua experiência com essa verdade tão essencial da teologia bíblica? Embora a palavra apareça apenas uma vez nas línguas originais da Bíblia (pronoia, At 24:2), o conceito está espalhado pelas Escrituras. Providência significa ver antecipadamente e, portanto, agir com interesse e sabedoria. Mas será que a ideia de providência ainda pode ser defendida?
Tempos de ruptura acabam criando movimentos em duas vias: aproximação e afastamento de Deus. Com o mal contagiando a sociedade, o amor se torna rarefeito e as pessoas tendem a atribuir sua insensibilidade a Deus. O Criador parece indiferente à sorte da humanidade. Mas isso não significa que Ele tenha perdido o interesse pelo nosso destino.
Um novo ano está começando, e este é um bom momento para refletir sobre a providência perdida. Se você tem enfrentado alguma circunstância complicada, não perca a fé. O secularismo tentou banir a providência do universo filosófico e cotidiano, mas você não está sozinho. Ao encarar 2021, saiba que Deus estará com você. E, quando algo bom acontecer, lembre-se de que, em vez de coincidência, pode ser providência.
Um feliz 2021!
MARCOS DE BENEDICTO é editor da Revista Adventista
(Editorial da edição de janeiro de 2021)
Última atualização em 5 de janeiro de 2021 por Márcio Tonetti.