Vozes no deserto

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A solução para a crise no púlpito, que torna o mundo mais árido e o povo mais sedento, passa pelo resgate da pregação bíblica
MARCOS DE BENEDICTO
O problema não é a pregação no deserto, mas o deserto na pregação. Foto: Adobe Stock

A cada sábado, milhares de pregadores adventistas ao redor do globo sobem ao púlpito para apresentar a mensagem do Céu. Mas o que acontece como resultado de tantos sermões? As pessoas veem a glória de Deus? Notam a santidade do Altíssimo? Percebem o amor e a justiça do Criador? Têm elas um vislumbre do caráter de Cristo? Sentem o toque do Espírito Santo? São esquadrinhadas e impactadas pela Palavra? Crescem em conhecimento? Os pecadores se arrependem? Os corações partidos são remendados? Os aflitos são tranquilizados? Os acomodados são inquietados? A adoração é autêntica? O que acontece quando seu pastor fala ou você prega?

Não é preciso ser um observador muito atento para constatar que a pregação experimenta uma crise. Em sua maioria, com honrosas exceções, os púlpitos estão pobres, e a reclamação é geral. A qualidade dos sermões caiu em muitas denominações, inclusive na nossa. E, se a pregação perde qualidade, a igreja perde inspiração, motivação, transformação e capacidade de impactar o mundo. Afinal, a pregação é o momento em que Deus fala ao nosso coração para mudar nossas atitudes e revolucionar nossa vida.

A pregação é fundamental na vida do povo de Deus. Por isso, Jesus não veio como ensaísta, filósofo ou mesmo teólogo, mas como pregador (Mc 1:14). Era o Logos, o Verbo divino (Jo 1:1), a síntese da mensagem celestial. Assim, seria um paradoxo se Ele não pregasse. Ao contrário dos deuses do Olimpo e das divindades do panteão romano, que mantinham distância dos meros mortais, Jesus Se aproximou da humanidade como o Deus encarnado (Mt 1:23; Jo 1:14). Era a personificação da pregação, a Palavra ao vivo, em todos os momentos e lugares.

Pregador carismático e poderoso por excelência, Jesus proclamava as boas-novas em cidades e vilas (Mt 9:35; Lc 4:43); equilibrava paixão e ternura, como no sermão da montanha (Mt 5–7) e na denúncia contra os hipócritas (Mt 23); ilustrava muito bem Suas pregações com parábolas inteligentes e até um toque de humor (Mt 13; Lc 15); apresentava uma mensagem completa, combinando aspectos espirituais e sociais (Mt 25); falava com profundidade e autoridade (Mt 7:29; Lc 4:32); pintava um quadro macro da história e da vida, focalizando os sinais do fim e a necessidade de preparo (Mt 24–25; Mc 13; Lc 21); e pregava com base na Bíblia (Lc 4:16-20).

A chegada de Jesus foi anunciada por um profeta que pregava no deserto (Mt 3:1-3), cumprindo a profecia de outro pregador cheio de sensibilidade e fervor (Is 40:3-5). Essa pregação incendiária foi a maneira idealizada por Deus para preparar o caminho para o Rei divino-humano, que também Se preparou no deserto para iniciar Sua poderosa pregação (Lc 4:1). Períodos no deserto podem ser prenúncios de grandes coisas, desde que haja fome, sede e rajadas do Vento divino.

De igual modo, temos hoje que preparar o caminho para a volta do Rei, e as dificuldades ainda existem. Estudos geográficos indicam que as áreas desérticas estão aumentando. Figuradamente, o mundo está se tornando um deserto, símbolo de aridez, isolamento e ambiente hostil. Mas é nesse território de condições extremas que a voz dos pregadores precisa ser ouvida. Por isso, a matéria de capa desta edição faz um convite para que os pregadores adventistas, com preparo, inteligência e ousadia, resgatem o poder da exposição bíblica.

MARCOS DE BENEDICTO é editor da Revista Adventista

(Editorial da edição de maio de 2019)