Um universo de amor

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Somente agora, depois que deixei de falar, sentir e pensar como menino, é que tive condições de avaliar a dimensão do oceano de amor em que eu mesmo nadei na infância

foto2-mae-fotoliaO conhecido escritor de histórias para crianças, Walter Wangerin Jr., relata uma de suas experiências da infância: “no escuro da noite, minha mãe vinha aconchegar-me na cama. Quando ela se sentava a meu lado, o seu peso afundava o colchão e me fazia rolar para pertinho dela. Sentia-lhe o calor do corpo. Sentia a mão refrescante na minha testa. Sentia a nuvem sagrada de perfume que a envolvia. Ouvia-lhe a voz baixa, densa pela emoção de me amar, e a doçura do momento quase me levava às lágrimas. Quantas vezes ela murmurou-me o seu boa-noite naqueles dias. E, no entanto, as palavras soavam sempre novas e deliciosas, porque ela era a minha querida”. Na manhã seguinte, “lá estava ela na cozinha, de pé junto ao balcão enchendo lancheiras. Seu roupão era todo desfiado e maltrapilho. O cabelo, desgrenhado. Mas eu sempre ignorava esses sinais, nadando no amor da noite passada”.

O relato do autor representa a experiência de muitos de nós. A vida adulta traz consigo os seus dilemas, mas também doces recordações. Quem não foi profundamente impactado pela influência materna? Somente agora, depois que deixei de falar, sentir e pensar como menino (1Co 13:11), é que tive condições de avaliar a dimensão do oceano de amor em que eu mesmo nadei na infância! Às vezes, quando nos encontramos, observo atentamente como ela me olha, e o seu olhar faz o meu coração inflar-se da segurança de que sua ternura permanece inalterável. E volto a ser menino, mas com a mente de homem; um homem que, porque chegou à paternidade, é capaz de compreender coisas que antes eram obscuras: por que tantas vezes ela teve que me dizer “não”? E então compreendo seus sentimentos quando preciso dizer “não” a meus próprios filhos.

A Bíblia fala diversas vezes e de várias maneiras a respeito do amor, sabedoria e solicitude das mães. Recordo-me, por exemplo, da devoção de Ana, a mãe do jovem Samuel. Ela deixou um exemplo digno de ser imitado. Podemos aprender sete preciosas lições a partir de sua experiência.

1ª – Ela orou antes de ter um filho. A Bíblia diz que ela chorava com uma angústia que lhe roubava até mesmo a vontade de comer. A pergunta de seu esposo nos ajuda a refletir sobre algo intrigante: “por que choras? […] Não te sou eu melhor do que dez filhos?” (1Samuel 1:8). A resposta é que o amor de seu esposo não podia substituir o amor de uma criança. Misteriosamente, Ana sentia falta de um ser que ela ainda não conhecia, mas a quem amava intensamente. Que linda lição para as jovens casadas que estão planejando trazer um novo ser ao mundo! Em um mundo tão cruel e conturbado pelo pecado, um filho deve ser fruto de amor, planejamento e oração.

2ª – Ela tinha consciência de que os filhos não nos pertencem. Os filhos são uma dádiva do Senhor (1Samuel 1:28). Por esta razão, ela levou Samuel para servir ao Senhor no templo, durante todos os dias de sua vida. Na verdade, “desde o primeiro despontar da inteligência do filho ela lhe ensinara a amar e reverenciar a Deus, e a considerar-se como sendo do Senhor” (Patriarcas e Profetas, p. 572).

3ª – “Por meio de todas as coisas conhecidas que o cercavam, procurou ela elevar seus pensamentos ao Criador” (Idem, p. 572). Como mãe, Ana teve o cuidado de atrair para Deus a atenção do seu filho.

4ª – Cada dia, seu filho era objeto de suas orações (Idem, p. 572). Existe muito poder na oração de uma mãe. Quando o jovem João Huss foi para a universidade, sua piedosa mãe não tinha dinheiro para deixar com o rapaz. Mas tendo consciência de outra riqueza, “ajoelhou-se ela ao lado do jovem sem pai, e invocou-lhe a bênção do Pai celestial. Pouco imaginara aquela mãe como deveria sua oração ser atendida” (Grande Conflito, p. 98).

5ª – Ana incentivava seu filho a participar das atividades do templo. Ela fazia isto preparando todos os anos uma roupa especial: “cada ano ela lhe fazia, com suas próprias mãos, uma túnica para o serviço; e, subindo com o esposo para adorar em Siló, dava ao menino esta lembrança de seu amor” (Patriarcas e Profetas, p. 572).

6ª – Ela orava para que ele fosse puro, nobre e verdadeiro (Idem, p. 572). Se todos nós deixássemos como legado às gerações futuras filhos que apresentassem essas mesmas características que se manifestaram na vida de Samuel, o mundo seria bem diferente.

7ª – A sétima lição está intimamente ligada à sexta. Ana “não pedia para o filho grandezas mundanas, mas rogava fervorosamente que ele pudesse alcançar aquela grandeza a que o Céu dá valor – que honrasse a Deus e abençoasse a seus semelhantes” (Idem, p. 572).

O resultado de uma educação como essa não poderia ser mais animador: “e o menino Samuel crescia em estatura e em graça diante do Senhor e dos homens. […] Crescia Samuel, e o Senhor era com ele, e nenhuma de todas as suas palavras deixou cair em terra” (1Samuel 2:26; 3:19). Essa história nos leva a refletir sobre o poder do amor e a influência de uma mulher que, na falta de um nome melhor, simplesmente a chamamos de mãe. [Foto: Christin Lola / Fotolia]

NILTON AGUIAR, mestre em Ciências da Religião, é professor de grego e Novo Testamento na Faculdade Adventista da Bahia e está cursando o doutorado em Novo Testamento na Universidade Andrews (EUA)

Última atualização em 16 de outubro de 2017 por Márcio Tonetti.