Sistema Cantareira ao reverso

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Do ponto de vista espiritual, continua existindo água em estoque para todos os sedentos deste mundo. E não é preciso pagar por ela
Foto: Mídia Ninja/Flickr
Foto: Mídia Ninja/Flickr

Há alguns dias, fiz uma conexão no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, e senti na pele os efeitos do racionamento d’água que está afetando parte do estado. Precisei usar bem menos água do que habitualmente utilizo para escovar os dentes. Ela descia pela torneira com a mesma lentidão da internet no meu celular quando não consigo um sinal 3G. A situação está chegando a um ponto tão alarmante que, em entrevista para um telejornal da afiliada da rede Globo no estado, o presidente da Sabesp, Jerson Kelman, admitiu a possibilidade de esvaziamento do Sistema Cantareira em março deste ano. O sistema é responsável por abastecer 6,5 milhões de pessoas na Grande São Paulo.

Refletindo sobre a questão, não pude deixar de pensar no fato de que a Bíblia conta a história de um “Sistema Cantareira ao reverso”. Faço referência à história do encontro entre Jesus e a mulher samaritana, contada no evangelho de João. Parecia uma ida corriqueira ao poço. Ela não podia imaginar o que estava para acontecer. Seus pensamentos e o remorso de uma vida marcada por sucessivos fracassos familiares devem tê-la deixado tão absorta que mal se deu conta do estranho forasteiro sentado junto à fonte (João 4:6). A narrativa deixa transparecer que ela já havia retirado água do poço quando se deparou com o pedido inusitado: “Dá-me de beber” (João 4:7). O texto expõe um misterioso paradoxo: aquele que tem tudo para dar, incrivelmente, pede; o criador das “fontes das águas” solicita um pouco de água para matar a sede.

Foi necessário que ele lhe aguçasse a curiosidade a fim que a mulher percebesse que o estranho misterioso tinha bênção maior para dar do que para receber: “Se conheceras o dom de Deus e quem é o que te pede: dá-me de beber, tu lhe pedirias, e ele te daria água viva” (João 4:10). Sua reação não poderia ser diferente: “Onde, pois, tens a água viva?” (João 4:11). Talvez por trás da pergunta estivesse o receio de que a soma em dinheiro devesse ser muito grande para obter esse tipo de água. Demorou um pouco até que ela compreendesse que se tratava de um convite estendido a toda a humanidade e em todas as épocas: “Todos vós, os que tendes sede, vinde às águas; e os que não tendes dinheiro, vinde, comprai e comei” (Isaías 55:1). Do ponto de vista espiritual, continua existindo água em estoque para todos os sedentos deste mundo. E não é preciso pagar por ela. É por isso que se chama Graça! Você tem experimentado dessa fonte?

NILTON AGUIAR, mestre em Ciências da Religião, é professor de grego e Novo Testamento na Faculdade Adventista da Bahia e está cursando o doutorado em Novo Testamento na Universidade Andrews (EUA)

Última atualização em 16 de outubro de 2017 por Márcio Tonetti.