Entenda por que precisamos dela e como alcançá-la
Maturidade espiritual tem que ver com a coerência entre o que professamos, o que vivemos e a relevância para o dia a dia do que acreditamos. Ela marca uma pessoa com traços de sabedoria, paz, confiança e coerência, o que glorifica o nome de Deus. Precisamos ter maturidade porque, sem ela a vida se desajusta, produzindo infelicidade. No entanto, por que muitos não a alcançam? Embora eu não tenha uma resposta, gostaria de sugerir algumas hipóteses.
Porém, antes de entrar nesse ponto, é necessário entender por que precisamos de amadurecimento espiritual. Primeiro, porque é uma ordenança bíblica. Por exemplo, o apóstolo Paulo aponta para a realidade de que a imaturidade espiritual gera problemas (1Co 3) e mostra que o propósito da vida cristã é o amadurecimento (Hb 6:1; Ef 4:11-16). Os livros de Tiago e Provérbios também tratam do amadurecimento espiritual ao se referirem à sabedoria. Segundo, porque o que é vivo e saudável cresce. O crescimento saudável é marcado pela integração de todas as dimensões que envolvem o ser humano. O ideal é que o crescimento físico, intelectual, emocional, técnico, relacional, etc., seja integrado e equilibrado. Por exemplo, uma criança, em algum momento da adolescência, cresce rapidamente. É o famoso estirão. No entanto, esse crescimento físico não é acompanhado igualmente por outras dimensões. Os pais costumam expressar a falta de integração entre o crescimento físico, intelectual e emocional dizendo: “Só tem tamanho!” Isso significa que o tamanho não determina o estado intelectual ou emocional, e que o indivíduo precisa de tempo para que as outras áreas também cresçam e sejam integradas harmoniosamente. Quando isso acontece, o indivíduo se torna um adulto, ou seja, alguém que alcançou certo grau de equilíbrio na integração de suas dimensões.
Chamo a atenção para o fato de que até o momento não toquei no tema espiritual. Isso porque não acredito que ele seja mais um elemento a ser equilibrado juntamente com os outros. Por vezes, listamos o espiritual como mais uma dimensão do ser humano. É comum nos referirmos ao ideal do crescimento físico, mental e espiritual. Contudo, considero equivocado esse raciocínio e penso que, talvez, seja uma das razões da deficiência no que diz respeito ao amadurecimento espiritual.
Ao classificarmos a espiritualidade como uma dimensão do ser humano, cometemos dois erros. Primeiro, a igualamos a outras dimensões (física, intelectual, emocional, etc.). Logo, a dimensão espiritual tem que competir por espaço com outras áreas. Segundo, ao definirmos a espiritualidade como uma dimensão ou categoria da vida humana, automaticamente a excluímos das outras dimensões. Como resultado, o crescimento físico, intelectual ou relacional não é espiritual. Desse modo, impedimos que a espiritualidade permeie todo o ser humano e retiramos, sem perceber, a presença de Deus de certas dimensões do dia a dia das pessoas.
Entre as várias implicações práticas dessa concepção está a ideia de que cuidar do físico não seja uma atividade espiritual. Portanto, quando jogo futebol ou frequento a academia não estou envolvido em uma atividade espiritual. Há também a crença de que, quando frequento a escola, estou crescendo intelectualmente, mas que essa não é uma atividade espiritual. Desse ponto de vista, Deus não tem que ver com essas atividades. Consequentemente, isso tira a responsabilidade espiritual durante essas atividades. A mesma lógica se aplica ao trabalho, bem como aos negócios e relacionamentos.
Ainda dessa perspectiva, pensamos que o amadurecimento espiritual ocorre nas atividades relacionadas com a dimensão espiritual, ou seja, quando dedicamos tempo para a leitura da Bíblia e de outras literaturas, para a oração, e quando frequentamos cultos e nos envolvemos em pequenos grupos, vigílias, estudos bíblicos, entre outras atividades “religiosas”.
Essa lógica parece estar dificultando o amadurecimento espiritual de muitos. Talvez seja mais apropriado, biblicamente coerente e relevante para a vida, entender a espiritualidade como o elemento integrador de todas as dimensões do ser humano. Afinal, é Deus que personaliza o crescimento físico, que dá todo entendimento intelectual e equilibra as emoções. Sem Ele as relações humanas tendem a ser desastrosas. Com essa transformação na maneira de enxergarmos a vida espiritual, existe o potencial de trazermos Deus de volta para todas as dimensões da vida. Se a espiritualidade é um elemento central e integrador, então, malhar, estudar, trabalhar, festejar, namorar, orar, cantar, cultuar ou brincar também podem ser atividades espirituais que, de maneira integrada, contribuem para a maturidade espiritual. Lembre-se de que maturidade espiritual tem que ver com a coerência entre o que professamos e vivemos e com a relevância do que acreditamos.
Se Deus está presente em todas essas atividades e em todos os ambientes, nossa atitude precisará ser coerente com Sua presença. Quando enfrentamos desafios no trabalho ou crises nos relacionamentos, Deus também está envolvido. Assim, a oração como diálogo constante e atitude coerente com a presença divina passam a ser naturais e desejáveis. A aplicação dos princípios e valores bíblicos do Reino de Deus passam a ser requisito indispensável no dia a dia. Como resultado, a fé se torna relevante, transformadora e coerente.
A espiritualidade como elemento central e de integração das várias dimensões da vida parece ser o que estava na mente do apóstolo Tiago quando escreveu: “Considerem motivo de grande alegria o fato de passarem por diversas provações, pois vocês sabem que a prova da sua fé produz perseverança. E a perseverança deve ter ação completa, a fim de que vocês sejam maduros e íntegros” (Tg 1:1-4).
A “prova da fé” acontece nos desafios e realizações, fracassos e sucessos, frustrações e alegrias diariamente, quer sejam no trabalho, nos negócios, nos relacionamentos, na igreja, nos estudos ou na carreira profissional. A vida é sempre espiritual!
PAULO CÂNDIDO é doutor em Ministério e está cursando PhD em Estudos Interculturais no Seminário Teológico Fuller, em Pasadena, Califórnia (EUA)
Última atualização em 16 de outubro de 2017 por Márcio Tonetti.