Consciência bíblica

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Os cristãos diante das tensões raciais

Davi Boechat

Foto: Adobe Stock

As discussões sobre conflitos étnico-raciais estão em alta e fomentam visões apaixonadas. O contexto agressivo que envolve os debates provoca uma sensação de afastamento por parte dos cristãos. No entanto, calar-se em meio a essa realidade significa deixar o mundo refém de ideologias que são incapazes de lidar com o caráter multifacetado do pecado humano. Afinal, as Escrituras apontam alguns caminhos para lidar com esse problema.

Um grande exemplo da teologia em favor da valorização humana pode ser lembrado em Martin Luther King Jr. Ele, um pastor com doutorado em Teologia, foi o vencedor do Nobel da Paz, em 1964, devido ao seu ativismo em relação aos direitos civis. Luther King acreditava que a igreja precisava participar nas discussões raciais de sua geração e, por essa razão, afirmou: “Marcharemos pela música do tempo ou, nos arriscando a críticas e abusos, marcharemos pela música da eternidade que salva as almas?” (A Dádiva do Amor [Planeta, 2020], p. 48).

Os conflitos raciais não são novidades para a igreja. Eles estiveram entre os grandes desafios enfrentados pelos primeiros líderes cristãos. A relação conturbada entre judeus e gentios foi objeto de discussões no concílio de Jerusalém (At 15). Ao tratar essa questão, Paulo afirmou: “Vocês, que antes estavam longe, foram aproximados pelo sangue de Cristo. Porque Ele é a nossa paz. De dois povos Ele fez um só e, na sua carne, derrubou a parede de separação que estava no meio, a inimizade” (Ef 2:13, 14).

O cristão de hoje, assim como no passado, é tentado a reproduzir padrões de hierarquia social estabelecidos, mas a lógica dessas relações é desafiada pelo ideal de Deus para a igreja. Em vez de nos unirmos em sociedades de mútua bajulação, devemos assumir uma posição de serviço ao outro. A unidade em Cristo pavimenta um caminho para combater a hostilidade racial.

A UNIDADE EM CRISTO PAVIMENTA UM CAMINHO PARA COMBATER A HOSTILIDADE RACIAL

Quando há o reconhecimento do sacrifício de Jesus em favor de todos, percebe-se que não se deve agir com parcialidade (Tg 2:9; Cl 3:11 Rm 2:11; At 10:34). Muito diferente das mitologias e teorias científicas que se propõem a explicar as origens, atribuindo o surgimento da humanidade à ação de deuses vaidosos ou ao acaso, a perspectiva cristã apresenta a origem da vida como um momento de dignidade para todos os seres humanos: “De um só homem fez todas as nações para habitarem sobre a face da Terra” (At 17:26).

A partir da fé cristã surgiram grandes movimentos de reação ao escravagismo, decisivos para o fim da escravidão na Inglaterra e que influenciaram Joaquim Nabuco, o maior nome do abolicionismo no Brasil (Abolicionistas Brasileiros e Ingleses [Editora Unesp], 2009). Os pioneiros adventistas também se engajaram nessa luta.

Décadas após a abolição norte-­americana, Ellen White reconheceu que as consequências da escravidão exigiam esforços de reparação: “As pessoas de cor negra estão sofrendo os resultados da escravidão em que foram mantidas” (para saber mais, clique aqui). Com base nessa perspectiva, podemos reconhecer que os 388 anos de escravidão no Brasil também deixaram marcas, e essas consequências precisam ser tratadas. Ao discutir a consciência negra, os cristãos devem estar preparados para encarar os problemas por meio de uma leitura bíblica da realidade.

A vocação cristã que inspirou os abolicionistas pode contribuir com as atuais necessidades de apoio. Ela é a alternativa mais efetiva às abstrações teóricas das ideologias, que não são capazes de abordar os problemas em sua complexidade. A cruz de Cristo ainda é a ponte para a justiça racial.

DAVI BOECHAT é jornalista

(Texto publicado na seção Enfim da Revista Adventista de novembro/2023)

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Última atualização em 17 de novembro de 2023 por Márcio Tonetti.