Do Zoom à ordenação

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Igreja discute e vota alterações nos regulamentos e no Manual da Igreja

Diogo Cavalcanti

Algumas reuniões de trabalho (business sessions) têm sido marcadas por uma bela combinação de vozes. Destacam-se a voz a suave e melodiosa de Ella Simmons, ex-vice-presidente da Associação Geral e presidente (chair) de algumas reuniões de trabalho, acompanhada pela voz grave do parlamentar assistente, Todd McFarland, presente em todas as reuniões. Também não se pode esquecer das intervenções entonadas de Hensley Moorooven, o secretário dos registros, entre outros chairs e secretários.

Sendo as vozes belas ou não, a habilidade da condução das proposições e debates parlamentares ajuda a resolver impasses quando os delegados se dirigem aos microfones. Isso se refere especialmente às modificações propostas pela Associação Geral dos regulamentos ou regulamentos (bylaws) e do Manual da Igreja. Nesses casos, cada palavra é importante e, algumas, cruciais, abrindo espaço para longos debates, às vezes, quando menos se espera.

Mudanças corriqueiras

Votos são necessários no caso de qualquer alteração dos regulamentos da igreja, conforme registrados no livro Working Policy, o qual tem uma versão sul-americana (em português e espanhol) de mais de 900 páginas, o livro Regulamentos Eclesiástico-Administrativos, atualizado anualmente. Sendo a clareza essencial, até mesmo o reposicionamento de uma palavra ou trecho no parágrafo para manter a ordem alfabética precisa ser votado, como ocorreu. Igualmente, a atualização de termos também se faz necessária. Por exemplo, substituiu-se a expressão telephone conference (“conferência por telefone”) por electronic conference (“conferência por meios eletrônicos”). Embora sejam itens simples, todos os que entram na agenda demandam votos, sem exceção.

Tecnicalidades e inovação

Quando se chega a expressões técnicas, como ocorreu na segunda sessão, iniciada no dia 6 de junho, às 14h, vários delegados foram ao microfone para questionar a substituição de interdivision employees (“empregados interdivisão”) por international service employees (“empregados de serviço internacional”). Os delegados questionavam se a atualização não tornaria o termo impreciso, especialmente no caso de obreiros que trabalham dentro de uma mesma Divisão, mas em outro país. De qualquer forma, a proposta para a alteração foi aprovada pela maioria dos delegados, que votam eletronicamente via aplicativo, seja no Dome (o estádio), seja em suas casas, pelo Zoom.

Foi votada também a permissão para o uso da expressão “serviço batismal” em vez de “cerimônia batismal”. Contudo, nas regiões onde se prefere usar “cerimônia batismal”, o uso permanece livre, visto que é utilizado no Manual da Igreja.

Uma inovação foi a aprovação da participação de comissões da igreja via Zoom. Esse fenômeno ocorreu nas comissões executivas da Associação Geral, e de todos os níveis organizacionais desde o início da pandemia. Porém, o voto dá oficialidade e amparo legal à prática, desde que atenda a um requisito básico: que seja uma reunião em que todos possam interagir uns com os outros ao mesmo tempo. A participação on-line ao vivo constitui oficialmente  presença nesse tipo de reunião.

Ordenação

O tema da ordenação, um ponto alto de San Antonio, voltou à pauta em Saint Louis, mais especificamente, sobre a alteração do termo “diácono(s)” por diaconato, incluindo assim as diaconisas. A mudança na terminologia contribui para manter a consistência no Manual da Igreja. Diversos delegados se levantaram ora para defender a mudança, ora para solicitar sua revogação. Estes últimos, em menor número, argumentavam que a Bíblia não defende o ministério feminino e que biblicamente não há diferença entre a ordenação de pastores, anciãos e diáconos.

Por sua vez, outros delegados afirmavam que essa era uma interpretação particular do texto e que o ministério feminino já é uma realidade há décadas em muitos países. Algumas delegadas também afirmaram que negar a ordenação às diaconisas representaria uma deslegitimização da obra que elas já realizam.

Ao fim dessa rodada que se prolongou por quase uma hora, prevaleceu a noção de que a igreja já havia avançado na direção da ordenação de anciãs muito tempo atrás. De fato, após alguns estudos foi votada já em 1975 (voto GCC 75-153) a participação e ordenação de mulheres no ancionato na Divisão Norte-Americana. Em 1984, um voto da Associação Geral confirmou o voto de 1975 e ampliou a autorização para as demais Divisões, o qual foi registrado por meio de voto pela Divisão Sul-Americana. Em 1995, as Divisões foram chamadas a consultar as Uniões sobre o tema, o que não foi implementado de forma geral.

Em resultado, negar a ordenação às diaconisas por alguma razão teológica significaria renegar os votos e procedimentos adotados pela igreja nas últimas décadas. A lógica da aprovação não foi meramente manter coerência com as práticas, mas a falta de uma compreensão bíblica suficientemente convincente para negar a jurisprudência (todos os votos anteriores). Assim, após várias participações ao microfone, finalmente foi proposta a mudança da linguagem no Manual.

Com uma voz bela ou nem tanto assim, com um inglês fluente ou acidentado, porém com mansidão, acuidade lógica e firmeza, os chairs do primeiro dia de reuniões precisaram ouvir as observações que vinham do “chão”, como se diz em inglês, ou seja, dos delegados. Atenderam aos questionamentos sobre o processo em si (points of order), demandaram propostas e abriam o momento de votação. Embora não se possa alcançar 100% de consenso, após muitas discussões e esclarecimentos, a compreensão amadurecia, e os votos só eram adotados com uma maioria expressiva (maior que 75%).

O que resultou foi uma legitimação ainda maior da participação feminina no ministério adventista. Elas podem ser diaconisas e anciãs ordenadas. Ao redor do mundo, especialmente no Norte global, mulheres têm atuado como pastoras. Essa é uma realidade nos Estados Unidos e em países europeus. É realidade também em Portugal. A adesão recente (desde novembro de 2021) da Divisão Sul-Americana à ordenação de anciãs após os estudos de uma comissão específica, reforça essa tendência mundial. 73% das Divisões já adotavam essa prática, a qual alargou suas fronteiras em Saint Louis.

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